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O legado de uma busca mortal

por | 3 jul 2025

Luiza Moura resenha o livro do jornalista inglês Dom Phillips, assassinado no Vale do Javari em 2024

ilustração: Kairo Rudáh, a partir de foto de Gary Carlton

No dia 5 de junho de 2022, o indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips foram dados como desaparecidos no Vale do Javari, uma das regiões mais remotas da floresta amazônica. Na época, eu tinha acabado de fazer 20 anos, me envolvido com o movimento ambientalista pouco mais de um ano antes e lembro perfeitamente da sensação de medo que senti quando soube da notícia de que os dois tinham sumido. Poucos dias depois, o mundo inteiro descobriu que Dom e Bruno tinham morrido, ou melhor, tinham sido assassinados na Amazônia.

Desde então, muita coisa aconteceu. As lutas do movimento ambientalista se ampliaram, o cenário ambiental do Brasil mudou, Dom e Bruno se tornaram símbolos dos defensores da floresta, assim como Chico Mendes e Irmã Dorothy. E eu segui acompanhando seus legados, projetos e sonhos, seja militando na causa socioambiental, seja denunciando as violências cometidas contra defensores da floresta.

Um desses legados, felizmente, foi publicado esse ano: o livro Como salvar a Amazônia: uma busca mortal por respostas (Compahia das Letras, 384 páginas), iniciado por Dom Phillips, que já tinha escrito quatro capítulos e estava justamente realizando pesquisas para a obra no Vale do Javari quando foi assassinado e, por isso, não pôde concluir nem ver publicado seu trabalho. Depois de sua morte, outros jornalistas como Tom Phillips, Eliane Brum e John Lee Anderson se juntaram para, a partir das anotações de Dom, terminar o que ele começou.

Ganhei o livro de presente de aniversário este ano e, imediatamente, comecei a ler. A introdução me fez chorar, lembrando os dias tenebrosos que vivemos em junho de 2022 e durante todo o governo de Jair Bolsonaro na presidência. A obra é incrível. Um trabalho jornalístico primoroso, com averiguação de fatos, entrevistas, coleta de dados e visitas de campo. Mais do que isso, é um excelente retrato da realidade amazônica que tanto desconhecemos e achamos tão distante. Dom foi até as pessoas, assim como fizeram depois seus colaboradores. Procurou entender suas realidades e vivências, escutou as vozes de indígenas, ribeirinhos e amazônidas. Também entrevistou os ruralistas, os grileiros e todos aqueles que destroem a floresta, tentando entender os motivos que os levam a isso.

Enquanto lia o livro, tive a oportunidade de ver uma homenagem para Dom na Feira do Livro do Pacaembu, evento literário que já se tornou tradição na cidade de São Paulo. Na ocasião, Alê, viúva de Dom, e Tom Phillips, amigo dele e um dos colaboradores do livro (apesar do nome eles não são parentes), falaram sobre a importância da publicação. Afinal de contas, os assassinos acharam que calariam seus trabalhos, suas denúncias e suas visões de mundo. Ao contrário, temos vários Doms e Brunos surgindo. A publicação do livro é fundamental para que os questionamentos que fizeram sigam circulando e sua memória e legado sigam vivos.

Ler Como salvar a Amazônia é fundamental para quem quer compreender a realidade amazônica nos dias de hoje, com análises bem feitas e bem produzidas. Mais do que isso, é crucial para todos os defensores de direitos humanos, ambientalistas e pessoas que, assim como eu, entendem que Dom e Bruno precisam sempre ser lembrados, homenageados e reverenciados. Para que não se repita e para que a gente nunca esqueça.

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