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Novo estudo confirma o que já sabemos: redes sociais demais fazem mal

Erik Nardini

Pesquisa realizada com 154 voluntários no Reino Unido demonstrou melhora no bem-estar daqueles que se desligaram das redes por apenas uma semana

Redes sociais demais podem fazer mal; quem diria? (foto: Robin Worral / Unsplash)

Começo esse texto fazendo algumas perguntas. Não é necessário que responda ao Ciência na Rua, basta responder a si própria(o). A primeira: quanto tempo você gasta em redes sociais por semana? Seu celular, seja Android ou iPhone, tem recursos para identificar o tempo dedicado a determinados aplicativos. Você se importa? Essa é a segunda pergunta.

A terceira dúvida é saber quais redes sociais você usa. Facebook? Talvez esteja um pouco ultrapassada. Instagram, será? Twitter? Quem usa Twitter senão acadêmicos, jornalistas e gente reclamona? Brincadeira, porém, depende. Provavelmente o TikTok, rede do momento: um aplicativo quase magnético cujo algoritmo, com precisão cirúrgica, gruda nossos dedos e olhos à tela para uma experiência de scrolling infinita e irresistível.

Nessa atividade de deslizar o dedo de baixo para cima e vice-versa surgem vídeos de animais de estimação, imagens da guerra na Ucrânia, receitas, maquiagens, política e fake news. Quanto mais utilizamos esses apps (não necessariamente o TikTok, mas sobretudo), mais seus algoritmos aprendem nossas preferências e, consequentemente, mais queremos utilizá-los. Pode até ser divertido, mas não significa que seja saudável.

Depressão, ansiedade e oito horas jogadas ao vento: efeitos antissociais das redes sociais

Pesquisadores da Universidade de Bath, no Reino Unido, publicaram no início de maio um estudo demonstrando algo que você talvez já saiba: dar um tempo nas redes sociais é algo que pode fazer muito bem para a saúde mental (e liberar cerca de oito horas por semana para que consigamos fazer outras coisas mais interessantes).

Em tradução livre, a investigação intitulada “Fazer uma pausa de uma semana nas mídias sociais melhora o bem-estar, a depressão e a ansiedade: um estudo controlado randomizado”, publicada no periódico americano Cyberpsychology, Behaviour and Social Networking, contou com a participação de 154 voluntários com idades variadas – de 18 a 72 anos.

Os participantes foram divididos em grupos, sendo um de controle e outro, experimental (no jargão científico, controle significa que determinada amostragem, seja de pessoas ou de qualquer coisa que se deseja estudar, é separada do grupo experimental, que por sua vez é submetido a um teste diferente para que possa, posteriormente, ser comparado).

Os pesquisadores identificaram que, ao se afastarem das redes por um período tão curto quanto uma semana, o grupo que se absteve das plataformas obteve melhoras significativas nos níveis gerais de bem-estar, reduzindo consequentemente sintomas de depressão, ansiedade e liberando praticamente uma jornada de trabalho inteira – oito horas – na vida de cada um dos entrevistados. Essas informações são bastante relevantes, especialmente se, com base nisso, olharmos para a realidade nacional.

Números do relatório do PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) coletados em 2019 e publicados em 2021 revelam que a população brasileira está cada vez mais conectada. No país, cerca de 82,7% dos domicílios têm acesso à internet. Trocando em miúdos, isso significa que aproximadamente 116 milhões de pessoas em terras tupiniquins têm à disposição acesso à rede e, consequentemente, às redes sociais.

Não significa que toda essa população passe oito horas por semana conferindo fotos e vídeos na internet, mas o risco não pode ser negligenciado. Ao mesmo tempo, pipocam dados mostrando que nós brasileiros somos o segundo povo que mais fica conectado, e o terceiro maior consumidor global de redes sociais: cerca de 3 horas e 40 minutos por dia.

Não parece saudável, e não são apenas os pesquisadores da Universidade de Bath que pensam isso. Uma breve consulta realizada dia 25 de maio de 2022 no Google Scholar – buscador para encontrar publicações acadêmicas – apresentou cerca de 12.800 resultados relacionados aos termos “redes + sociais + ansiedade” e outros 10 mil associados a “redes + sociais + depressão”. A amostragem se concentrou em publicações em língua portuguesa.

Em um dos artigos (“O impacto das redes sociais na ansiedade e saúde mental de jovens e adolescentes”, da Faculdade Patos de Minas) o objetivo era compreender as relações entre os avanços das redes sociais com o aumento da ansiedade e problemas mentais, sociais e emocionais nos jovens e adolescentes.

Em outro, (“Depressão entre adolescentes que usam frequentemente as redes sociais: uma revisão da literatura”, da Universidade de Pernambuco-UPE/Centro Universitário Unifacol) uma revisão bibliográfica realizada com base em artigos catalogados nas bases do Scientific Electronic Library Online (SciELO) e PUBMED os pesquisadores queriam identificar na literatura científica os estudos sobre depressão em estudantes adolescentes que usam frequentemente as redes sociais.

E há uma infinidade de outros estudos em andamento, o que indica que a preocupação é global, e não restrita a um recorte geográfico particular. Diante disso, será que não é o momento de nós mesmos olharmos para os nossos próprios hábitos?

Pular de uma rede social para outra até esgotar as recomendações dos algoritmos é estranhamente normal (foto: Michael Effendy / Unsplash)

Scrollar é viver?

Essa questão é bastante curiosa. No vaivém do scrolling, é fato que cedo ou tarde nos cansamos. Entretanto, em vez de nos afastarmos, parece haver algum elemento que nos condiciona a procurar novos conteúdos para consumir. Relato, abaixo, uma experiência de campo não muito científica, mas não menos interessante, que fiz exclusivamente para esse texto.

Dias atrás estava no metrô, em São Paulo, e comecei a observar a distância as pessoas utilizando seus aparelhos celulares. Minha intenção não era bisbilhotar a vida alheia, mas o comportamento das pessoas diante da tela. Consegui identificar os aplicativos utilizados por meus “voluntários involuntários” pois as interfaces são óbvias.

Notei que a grande parte das pessoas intercalavam entre WhatsApp, Facebook, Instagram e TikTok. Não raramente, após abrir e fechar os apps diversas vezes, a turma que eu observei ficava estática, com os olhos fixados na tela do celular, como se nada mais pudesse ser feito. Afinal, todos os stories já haviam sido assistidos, os status do WhatsApp haviam sido conferidos e os sininhos de notificações estavam zerados. “Será que eu já vi tudo o que tinha pra ser visto?”

Se essa consulta incessante às plataformas é agradável ou não, é uma questão subjetiva. O que a ciência diz, porém, é que deve haver um limite. No estudo inglês mencionado acima, o pesquisador Jeff Lambert, líder da investigação, afirmou que muitos dos participantes relataram efeitos positivos por estarem fora das mídias sociais. De acordo com o acadêmico, isso sugere que “mesmo uma pequena pausa pode ter um impacto”.

Bom senso e equilíbrio parece ser o melhor caminho

Ninguém quer demonizar as redes sociais. Elas, inclusive, podem fazer parte de uma rotina bastante saudável para mitigar efeitos causados pela solidão, pela distância e pela ausência do contato físico, por exemplo.

Um outro estudo publicado em meados de 2021 (“Solidão e sua associação com o uso de mídia social durante o surto de COVID-19”, em tradução livre, da Universidade de Ciências Aplicadas da Noruega) mostrou que o uso das redes entre participantes de meia-idade foi associado a menor solidão social. Os pesquisadores descobriram que o “engajamento dos idosos nas redes sociais poderia ser um artifício para reduzir a solidão durante a pandemia de covid-19”.

O recorte na população mais idosa foi escolhido deliberadamente, mas é possível expandir essa amostragem uma vez que a solidão pode atingir a todos. E o coronavírus entrou na história porque, no fim das contas, a pandemia nos afastou durante muito tempo. Mas é possível extrapolar isso para quando escaparmos da crise sanitária.

Há esforços concentrados em se mensurar o impacto dos meios de comunicação virtuais na população, no longo prazo. Embora já estejam entre nós há um bom tempo, as redes são mutáveis – uma metamorfose que torna essencial que pesquisas como as relatadas aqui sejam constantemente atualizadas. A mensagem que parece permanecer é que as redes podem ser legais e benéficas, elas só não podem ser tudo.

 

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