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Mês das mulheres – Rita de Cássia dos Anjos
Dia internacional da mulher

por | 2 mar 2021

Astrofísica de 37 anos é professora da UFPR desde 2014

Foto: arquivo pessoal

Rita de Cássia dos Anjos, 37 anos, está convencendo a Fundação Araucária, do Paraná, de que investir recursos suficientes para a construção de duas estruturas que irão em telescópios no Cherenkov Telescope Array (CTA), no deserto do Atacama, no Chile, seria uma boa, não apenas para o avanço da pesquisa básica em raios gama no estado, mas também para agitar a indústria paranaense, que poderia atender à demanda de produção desses equipamentos. E, muito em breve, a assinatura de um contrato de valor considerável deve selar o apoio da fundação ao projeto.

Professora, desde 2014, da Universidade Federal do Paraná (UFPR) no setor Palotina, um pequeno município com cerca de 32 mil habitantes a quase 600 quilômetros de Curitiba, no extremo oeste do estado, Rita de Cássia dos Anjos certamente conta com bem mais que boa oratória para convencer seus interlocutores. Os percursos dessa jovem pesquisadora no campo da astrofísica de partículas, a segunda a figurar na lista de 10 nomes que o Ciência na rua decidiu apresentar para marcar o mês consagrado às mulheres – ainda que nossos também sejam todos os meses e todos os dias –, revelam uma consistência, garra e clareza de propósitos impressionantes. E tudo isso embalado em encantadora simpatia e sorrisos fáceis.

Pode-se começar dizendo que Rita foi, no ano passado, uma das sete ganhadoras do 15º prêmio L’Oréal-Unesco-Academia Brasileira de Ciências para Mulheres na Ciência – venceu na categoria “Ciências Físicas”. Há que se acrescentar que a cientista graduada em física biológica pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) em 2007, mestra e doutora em física pela Universidade de São Paulo em São Carlos (USP-SC), respectivamente em 2009 e 2014, não esmoreceu quando o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) não lhe concedeu a bolsa pedida de pós-doutoramento para continuar em São Carlos, no grupo de raios cósmicos de seu orientador, Luiz Vítor de Souza Filho. Sem bolsa de pesquisa, tinha que sobreviver de outra forma e foi à luta: fez naquele mesmo ano o concurso para docente da UFPR e conquistou uma das duas vagas disponíveis.

Foto: arquivo pessoal

Paulista de Olímpia, pequena cidade de aproximadamente 54 mil habitantes no noroeste do estado, a 438 quilômetros da capital e a cerca de 100 quilômetros de São José do Rio Preto, onde fez a graduação, Rita de Cássia dos Anjos pode ter até ficado chateada com a distância dos amigos, colegas e dos movimentados ambientes de pesquisa de São Carlos e Campinas em que se encontraria em Palotina.

Mas a mais nova dos oito filhos de Antonia Santos dos Anjos, 76 anos, e Carmelino Pereira dos Anjos, 91anos, não permitiria que a vida academicamente acanhada no oeste do Paraná a afastasse realmente de seus propósitos e do intercâmbio com grandes centros de pesquisa da área de física de altas energias em que ela se dispunha a crescer. Assim, além do contato com os núcleos paulistas, aprofundou os laços com os colegas vinculados ao CTA e ao Observatório de Raios Cósmicos Pierre Auger, que também tem uma grande instalação na América do Sul, mais precisamente em Malargüe, no oeste da Argentina. Mais: foi ainda mais longe e movimentou Palotina.

Mas vamos por partes. É mais que tempo de dizer que o CTA, a que Rita está associando Palotina, é um imenso empreendimento de pesquisa multinacional, que envolve mais de 1.500 pesquisadores de 32 países na instalação do Chile e na das Ilhas Canárias.

É tempo também de contar que para a garota de Olímpia que fez todo o ensino fundamental e médio em escolas públicas – Escola Municipal Santo Seno, Escola Estadual Maria Ubaldina de Barros Furquin e Escola Estadual Capitão Narciso Bertolino – era a mãe, atendente de enfermagem, a grande inspiração para manter sempre bem alta e afiada a sua curiosidade, primeiro por biologia, antes de se apaixonar por física, já no ano e meio de cursinho pré-vestibular, pago por uma das irmãs mais velhas. “Minha mãe era e é um ponto fora da curva, uma mulher excepcional, com planos. Já meu pai, um excelente pedreiro, assim como a família dele, eram mais acostumados a manter os empregos trabalhando na casa dos outros”, conta Rita de Cássia dos Anjos. Foi certamente mais pelo incentivo da mãe que, dos oito filhos, seis fizeram universidade. Mas desses, só Rita foi à universidade pública. Os demais, trabalhando, custearam seus cursos superiores em escolas privadas.

Do interior do Paraná, em dado instante Rita partiu para uma estada curta em Nova York, numa colaboração com o Pierre Auger. Em 2019, seguiu para um pós-doc de seis meses no Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica e, na sequência, para três meses no DESY, instituto de física alemão da Sociedade Helmholtz, em Zeuthen, perto de Berlim.

Rita de Cássia dos Anjos diz que estar numa pequena cidade não é motivo para deixar de fazer pesquisa e ir muito longe. Alguém duvida, em se tratando dela?

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