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Estudante de física estreia coluna no Ciência na Rua

por Thaciana de Sousa Santos

Thaciana conta de suas primeiras impressões na USP

Bom, acho que tenho que começar me apresentando. Me chamo Thaciana e tenho 19 anos. Sou natural de Aracaju-SE e moro em SP há uns 15 anos. Fui filha única durante 12 anos e sempre fui diferente das outras crianças. Aos sete anos, comecei a jogar xadrez, era a única menina tão nova e negra na turma. Só aos 10 anos que comecei a sair para andar de bicicleta com outras crianças, antes disso eu ficava em casa, montando quebra-cabeças. Aos 13 anos, tentei me encaixar como uma adolescente comum, mas nunca me senti assim, eu não era como todas as meninas da minha idade, no sigilo eu assistia ‘The Flash’ (ainda assisto, mas não é mais no sigilo).

O universo sempre me fascinou, mas deixei esse gosto de lado quando tinha 15 anos. Eu queria seguir uma carreira que gerasse dinheiro, porque sou preta e pobre e sentia que tinha o dever de ganhar dinheiro para melhorar a vida da minha família. Aos 16, percebi que odiava a ideia de fazer engenharia, decidi que iria fazer algo por amor (as aulas de projeto de vida me ensinaram que eu sou mais do que a sociedade definiu) e foi aí que eu entendi que amava física.

Contei toda essa história para chegar até o momento de agora. Em 2022, fui a primeira da minha família a entrar em uma universidade pública. Hoje, sou caloura do Bacharelado em Física na Universidade de São Paulo (a melhor do país, apenas). E é sobre isso que eu vim falar.

O que eu senti no momento que em que vi que fui aprovada na USP é inenarrável, foi um chororô danado, uma alegria que não conseguia conter. Sou grata a todos que me apoiaram, em especial ao meu professor de física do ensino médio, o Rafael, ele sempre acreditou em mim e também sabia que a minha decisão era a certa. Mas, o que eu não esperava era ser a única mulher negra retinta na turma. O que eu não esperava era o sentimento de incapacidade logo na primeira semana de aula.

A USP é, sim, incrível, faz jus ao nome, com toda a certeza do mundo. Mas uma coisa que a USP não é é ser acolhedora com quem veio de escola pública. Tenho a sã consciência de que escolhi um curso elitista, com 98% de homens, brancos e ricos. Mas tratar com tanto desdém quem não se encaixa no padrão, é imperdoável. Os professores correm com a matéria como se todos já soubessem do conteúdo, ainda estou perdida na derivação e integração de funções para Física 1 e a professora já está passando energia e conservação de energia. É até grotesca a forma como organizam o currículo sem pensar nas dificuldades das pessoas.

Para mim, é humanamente impossível dar conta de tudo, já que os professores não passam o conteúdo de forma clara. Para o 1º semestre do curso, eu já tranquei uma matéria. É claro que o sentimento do momento é de desespero, não há outra coisa que eu sinta de segunda à sexta-feira. Aos finais de semana o sentimento é de gratidão, porque estou na USP

Para essa semana eu já passei informação demais. Resumi a minha vida inteira e ainda contei sobre como estou me sentindo nesse primeiro semestre de curso. Para os nossos próximos encontros, que acontecerão todas terças-feiras (estou esperando por vocês), tenho certeza de que os perrengues aumentarão, mas eles continuarão, porque a Física é linda e precisa ser compartilhada, para quem, assim como eu, quer saber o porquê de tudo.

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