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Da periferia à USP: uma mobilidade precária

por | 14 set 2022

por Thaciana de Sousa Santos

O percurso de casa até a USP é exaustivo, mas o aconchego da família compensa, diz colunista

Não tenho muito o que contar em relação aos estudos, passei a última semana em casa e dormi o máximo que pude. Eu comentei que lidei com uma reprovação no primeiro semestre e não sabia ao certo quando iria refazer a disciplina – pois bem, estou refazendo nesse semestre. Deu nem tempo de esfriar!

Mas não vou falar sobre como estou lidando com as disciplinas, não tem nada de novo, apenas agora eu estudo mais, claro!

Já contei sobre a vida de uma caloura na universidade, que não tem sido fácil, mas não falei ainda sobre o meu caminho diário até a universidade.

Sim, estou vivendo a minha maior realização, mas o percurso da minha casa até o Instituto de Física, distante 29 quilômetros, é cansativo. Gasto quatro horas por dia no transporte público, com sorte, três horas e 30 minutos. É muito tempo, além das quatro horas de aula. Não posso ter o luxo de sair atrasada de casa, senão perco as aulas. Eu pego primeiro um ônibus do Morro Doce, na zona norte, até a estação Domingos de Morais, daí pego o primeiro trem, linha diamante, no sentido Barra Funda; de lá pego outro da linha vermelha sentido Corinthians- Itaquera, desço na República e pego o terceiro trem, linha amarela, sentido São Paulo-Morumbi, para descer no Butantan; aí tomo um ônibus circular até a cidade universitária. Na volta é a mesma coisa, só que, da Domingo de Morais em diante, pego dois microônibus para descer mais perto de casa e, assim, o meu pai não precisar ir me buscar.

Com toda essa jornada, já pensei em pedir moradia na universidade. Facilitaria a minha vida se morasse na USP já, mas provavelmente, não tenho a distância mínima necessária [35 quilômetros desde a casa]. Mas por outro lado, eu estou bem. Amo a minha casinha, ter os meus pais por perto, ver o meu irmão crescer, estar perto das minhas amigas e do meu namorado. Amo a comida da minha mãe – não tem nada melhor-, o carinho de todos nessa nova fase. Não estou preparada para perder.

O percurso é exaustivo, perco horas de estudo, além do estresse. Sempre tem alguém pronto para provocar as outras pessoas ou arrumar confusão no caminho. Os ônibus atrasam, Há o risco de chuva. O pior, com certeza, é na volta.

As aulas vão até às 23h, mas os professores não estendem até o fim porque sabem que tem gente que pega o transporte público. Uma vez, já neste novo semestre, em plena sexta-feira, quando fiquei até as 23h na sala, tudo o que tinha para dar errado, deu: o ônibus que pego até a estação de metrô atrasou quase 30 minutos, depois descobri que o último trem sai 00h.

Pronto, foi aí que eu entrei em desespero, já queria chorar porque não ia chegar em casa e ia ter que dormir na Barra Funda. Liguei para a minha mãe e pedi para o meu pai ir me buscar, ainda bem que tinha essa possibilidade.

Lembro que esse dia foi tenebroso e para não viver essa situação novamente, saio um pouco mais cedo da aula. Porque dormir em alguma estação não dá. Imagina, voltar para casa só quando os meios de locomoção voltarem a funcionar novamente!

Eu tinha muitos medos, mas o meu pesadelo é esse agora. Se eu morasse no CRUSP ou em alguma república, não passaria por esse perrengue. Mas eu estaria perdendo o processo de alfabetização do meu irmão, os abraços dele. Não veria o sorriso da minha mãe e nem presenciaria o quanto ela está orgulhosa.

Não veria o meu namorado com frequência e perderia muitos momentos. O caminho é desgastante e estressante, mas eu não o trocaria por nada. Tiro um cochilo no ônibus, estudo no metrô e assim vai. Ainda tenho mais quatro anos pela frente, não posso desistir.

O jeito é tentar tornar a viagem prazerosa e não pensar em uma tortura. Ler um livro, ouvir música ou assistir uma série.

 


Thaciana de Sousa Santos, a Tatá, é estudante de graduação do Instituto de Física da Universidade de São Paulo e escreve semanalmente para o Ciência na Rua

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