Egberto Siqueira, Edgardigital
Cerca de um quinto das hospitalizações por síndrome respiratória aguda grave não têm a informação raça/cor preenchida nos formulários dos pacientes
Cerca de 21,7% das hospitalizações por síndrome respiratória aguda grave não têm a informação raça/cor preenchida nos formulários dos pacientes. O levantamento faz parte do estudo “Racismo e COVID-19 no Brasil: o que aprendemos com os dados (ou a falta deles)?”, liderado por pesquisadoras do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC-UFBA.) O trabalho recebeu menção honrosa no “Simpósio de Saúde da População: Racismo e Saúde”, promovido pela Universidade Drexel (Estados Unidos), nos dias 7 e 8 de abril.
A pesquisa tem como objetivo discutir a negligência da variável raça/cor na pandemia e os impactos sobre a saúde da população negra. “Em primeiro lugar, essa negligência cria um viés de subnotificação em qualquer análise epidemiológica que se pretenda fazer a partir do campo raça/cor”, destaca Dandara Ramos, professora do Instituto de Saúde Coletiva (ISC/UFBA) e pesquisadora do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs-Fiocruz). O estudo é realizado em parceria com as pesquisadoras Andrêa Ferreira (ISC/UFBA/Cidacs-Fiocruz) e Emanuelle Góes (Cidacs/Fiocruz).
Ainda segundo a professora, a ausência desse tipo de informação ajuda a disfarçar as desigualdades raciais e afeta outras dimensões de dados, como escolaridade e local de moradia. “Geralmente, um dado faltante em raça também será faltante em outros campos importantes para o estudo dos determinantes sociais. Se a gente não tem como visualizar as desigualdades, não tem como intervir para corrigi-las”, observa.
Para chegar aos resultados, as pesquisadoras coletaram informações do banco de dados de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) do Ministério da Saúde. O estudo leva em consideração as hospitalizações realizadas entre janeiro de 2019 e março de 2021. Ainda de acordo com o levantamento, o preenchimento da variável raça/cor é ainda mais negligenciado no Distrito Federal, onde 58,6% dos registros ignoram esse tipo de informação nas fichas de atendimento.
Meninas negras e indígenas: múltiplas violências
O trio de pesquisadoras também foi premiado pela apresentação do estudo “Intersecção de raça e gênero em autorrelatos de experiências violentas e polivitimização de meninas no Brasil”. A pesquisa aborda a questão da violência e a polivitimização (acúmulo de exposição a diferentes tipos de violência) entre os grupos étnicos de adolescentes.
O levantamento é baseado em informações da Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE), realizada pelo Ministério da Saúde em parceria com o Ministério da Educação, e aponta maior violência contra meninas negras e indígenas em comparação com adolescentes brancas. Os resultados detalhados do estudo devem ser publicados em breve em periódico específico.
Para a professora Dandara Ramos, a premiação dos dois estudos no “Simpósio de Saúde da População: Racismo e Saúde” reforça o reconhecimento dos temas e a contribuição do Brasil para o cenário internacional. O evento reuniu pesquisadoras de diversos países com o objetivo de discutir a interseção do racismo e da saúde, além de apresentar soluções sustentáveis para a promoção da equidade. “Trazer esses dados e essa discussão é muito importante para nós, tanto do ponto de vista acadêmico e científico, como pela relevância social e de promoção do direito à saúde da população negra”, conclui.