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COP30 – No começo, era Belém

A cidade respira a Conferência e, desde o aeroporto, visitantes são lembrados de que ali começa a conexão com a floresta

Foto: Luiza Moura

Enquanto o avião sobrevoava o rio Guamá e eu via os primeiros tons de verde da floresta, meus olhos encheram de lágrimas e eu me senti verdadeiramente emocionada por estar chegando a Belém para a COP30. A chegada me causou medo: muita turbulência no fim de um voo longo, e muitos sinais de “apertar os cintos” apareceram no painel. No solo, um vento quente, um calor abafado, equatorial, que gruda mesmo na pele.

A cidade está respirando a COP. Ao descer do avião, painéis com imagens da floresta saúdam os visitantes, exibindo frases como “a sua conexão com a floresta começa aqui”. Imagens do curupira, mascote dessa edição, estão espalhadas pelo aeroporto, pelos táxis e por toda a cidade. O trânsito também está carregado, a região do Mercado Ver-O-Peso, ponto turístico tradicional da cidade, está constantemente cheia, com brasileiros e estrangeiros buscando lembrancinhas tradicionais de Belém.

No trajeto do aeroporto até o local onde estou hospedada, o motorista do Uber me mostrava no mapa onde ficam vários pontos importantes para a Conferência. O Parque da Cidade, onde estão localizadas a Blue Zone e a Green Zone, a Universidade Federal do Pará (UFPA), onde será a Cúpula dos Povos, e até o bairro Jurunas, onde o Chris Martin, cantor do Coldplay, andou de bicicleta esses dias, quando estava na capital paraense. O motorista aproveitou o caminho congestionado para me contar também sobre as obras que foram feitas para a COP. Em uma delas, realizada no centro da cidade, a carcaça de um navio naufragado foi encontrada durante os procedimentos da obra.

O trânsito pesado, que alongou meu trajeto, também deu a oportunidade para o motorista me contar o que, segundo ele, era “o lado negativo” das obras. A demolição de casas em favelas e periferias e a exclusão de uma parte da população, que aparentemente não irá desfrutar tanto dos benefícios trazidos pela Conferência.

Ao que parece, a população toda sabe que a COP está rolando. Na semana passada, a Cúpula dos Líderes reuniu mais de setenta chefes de Estado para as primeiras conversas e os primeiros discursos da Conferência das Partes. Um dos pontos importantes desses dias foi o anúncio do TFFF, o Fundo Florestas Tropicais para Sempre, proposta criada pelo Brasil, que pretende remunerar os países que preservam suas florestas tropicais, invertendo a lógica de “pagar para não desmatar” para a lógica de “pagar para proteger”. A ideia é arrecadar cerca de US$ 3 bilhões que devem ser pagos para o Fundo ao longo de dez anos. Desde o seu anúncio, no dia 6 de novembro, 53 países já declararam oficialmente apoio ao projeto.

Outro ponto importante também já causou impacto positivo, mesmo antes da abertura oficial da Conferência das Partes, que acontece nesta segunda-feira, 10 de novembro: a chamada Declaração de Belém, também proposta pelo governo brasileiro, foi adotada por mais de 40 países, inclusive pela União Europeia. O texto tem um enfoque importante na diminuição de desigualdades sociais, no combate à fome e na atenção às pessoas, entendendo que a crise climática agrava vulnerabilidades sociais que acontecem historicamente. O texto, que já está disponível na íntegra na internet, afirma, por exemplo, que: “ A mudança do clima, a degradação ambiental e a perda da biodiversidade já estão agravando a fome, a pobreza e a insegurança alimentar, comprometendo o acesso à água, piorando os indicadores de saúde e aumentando a mortalidade, aprofundando desigualdades e ameaçando meios de subsistência, com impactos desproporcionais sobre pessoas já pobres ou em situação de vulnerabilidade.”

Para além dos eventos oficiais, Belém também está fervendo com eventos paralelos, coordenados por organizações não governamentais, governos, instituições da sociedade civil, movimentos sociais, grupos de ativistas, professores, pesquisadores, etc. Um exemplo desses eventos foi a visita guiada pelo navio do Greenpeace, o Rainbow Warrior, o “Guerreiro do Arco Íris”, em português. O navio, que é um símbolo da luta socioambiental, já navegou pelas águas de mais de 50 países em campanhas contra o uso de combustíveis fósseis, a favor da preservação ambiental e de uma transição energética justa.

Atracado no porto da Universidade federal do Pará (UFPA) durante os dias 8 e 9 de novembro, o navio recebeu grupos grandes de visitantes que queriam conhecer mais sobre a atuação do grupo e do navio. Mesmo em um calor com sensação térmica de 38 graus, os visitantes enfrentavam a longa fila — que chegou a durar mais de três horas segundo os guias — para conhecer por dentro o veleiro imponente com uma bandeira com os dizeres “Ação, Justiça, Esperança”.

Na fila, encontrei moradores da cidade, professores da UFPA, ativistas socioambientais e muitos curiosos que queriam ver o funcionamento do navio. É perceptível por aqui que a população tem estado interessada e atenta às discussões referentes à COP30.

Como já dito, a abertura oficial da trigésima Conferência das Partes acontece nesta segunda-feira,10. As negociações sobre os mais diferentes temas devem ser quentes — assim como o clima de Belém, está fazendo um sol para cada um por aqui. Estimativas da UNFCCC, a Convenção Quadro das Nações Unidas para Mudanças Climáticas, organizadora das COPs, apontam que cerca de 50 mil pessoas devem passar pela Blue Zone durante os dias do evento.

Simultaneamente, do lado de fora das zonas oficiais, movimentos sociais de cerca de 61 países devem se encontrar na Cúpula dos Povos, um dos principais eventos paralelos, que será sediado na UFPA e tem a justiça climática como um dos motes centrais.

Assim, durante os próximos dias, Belém será palco de uma confluência de saberes, vivências, vozes, intenções, sotaques e lutas. Entre salas oficiais e espaços paralelos, entre ativistas e diplomatas, entre chefes de delegação e líderes de comunidades indígenas e tradicionais, Belém se torna, nos próximos dias, o verdadeiro centro do mundo. O epicentro da transformação. O começo do presente e do futuro.


Luiza Moura, bacharela em relações internacionais e ativista socioambiental, tem uma coluna quinzenal no Ciência na Rua, e está em Belém para a cobertura da COP30

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