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OruMbya, um projeto incrível

por | 20 set 2022

por Thaciana de Sousa Santos

A ciência é também para meninas negras e indígenas

Arte: Capitão Rato

Voltei para mais um texto. Tenho algo muito legal para contar, mas antes vou deixar vocês por dentro da minha semana. Foi até tranquila, tirando a aula de física experimental, que foi um terror. Tínhamos que descobrir a aceleração da gravidade e não conseguimos. Era um experimento de queda livre com um ovo (não um ovo de verdade) e havia um equipamento que marcava as posições (alturas) do ovo enquanto ele caía.

Muita coisa deu errado, porque o tempo já foi pré-estabelecido. E não era em segundos. Era em unidade de tempo. Veja, 1 u.t é igual a 0,017 segundo, resultado da divisão 1/60, basicamente 1 divido por 1 minuto ou 60 segundos. A posição estava em milímetros e tinha que converter para metros e mesmo assim, não deu certo. Vamos tentar refazer para ver se agora, conseguimos.

Estou participando de um projeto que visa incentivar meninas negras e indígenas, de 14 a 20 anos, a se ligarem em ciência, o OruMbya – Mulheres do mundo sócio-cultural-tecnológico. O nome vem de Orum, que significa céu em yorubá, e Mbya, que é o nome da etnia Guarani brasileira, na mesma língua. Na prática é um workshop promovido pela Casa da Tia Ciata em colaboração com o Observatório de Valongo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (OV/UFRJ), a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), com quatro aulas on-line aos sábados. Começaram em agosto e vão até novembro, uma aula por mês. E, em dezembro, teremos um encontro presencial, no Rio de Janeiro.

Se quiser saber mais sobre a Tia Ciata, Hilária Batista de Almeida, uma grande personagem negra nascida no século XIX e das mais influentes da cultura negra carioca no começo do século XX, veja no site da Organização dos Remanescentes da Tia Ciata (ORTC), https://www.tiaciata.org.br.  Mas o projeto em que estou, dedicado a celebrar a Astronomia como combustível da vida, foi idealizado por Alan Brito Alves, astrofísico e professor da UFRGS e Arianna Cortesi, professora e pesquisadora da UFRJ.

Tia Ciata

Na primeira aula, a pauta foi indígenas, povos esquecidos, mesmo sendo tão importantes. São eles os verdadeiros nativos do nosso país e, para preservar todo o seu conhecimento e cultura, às vezes preferem ficar excluídos de nós. Estão certos, estão defendendo o que acreditam. Mas as meninas indígenas precisam ocupar um espaço nas escolas e universidades. Precisam estar na ciência.

A ciência médica avançou muito e sempre está inovando, procurando métodos para salvar cada vez mais as vidas. Estamos acostumados a nos entupir de remédios, em qualquer ocasião, mas para os indígenas, sempre tem algo natural para o problema.

Se eu não me engano, em 2019, eu visitei uma aldeia indígena e lá eu percebi quanta cultura não está nos livros de história. Vi eles plantando o próprio alimento, fazendo os seus rituais com base nas suas crenças, a língua deles sendo falada pelas crianças.

É um mundo inteiro que passa despercebido, que não tratamos com respeito, cujo valor não entendemos. São povos que precisam ocupar o seu espaço nas universidades públicas. Eu sei que é cada vez mais difícil, e eu espero que agora melhore. Mesmo com (poucas) cotas, tem o problema da fraude, dificultando ainda mais o acesso.

Imagine o quanto seria proveitoso todo o conhecimento indígena junto com a ciência. O tanto de meninas e mulheres apaixonadas pela astronomia e física, por medicina ou engenharia, mas que não conseguem ocupar esses espaços porque não tem quem as incentive. Ou até mesmo as que tem ascendência indígena que não possuem esse contato intenso com a cultura, que não se autodeclaram, que se sentem insuficientes para mudar o sistema educacional.

Eu espero que elas possam se espelhar em alguém, que o OruMbya mude vidas e as incentive. É um projeto incrível, mas não tem tanta visibilidade. Apenas algumas garotas, algo entre 10 e 15, boa parte do Rio, estão participando. Acho que é um projeto que merece estar em todas as escolas e atingir o país inteiro.

Estou entendendo mais o quão importante é o meu papel no mundo e como devo espalhar o pouco que sei com todos. Como tenho que falar com amor sobre a ciência e mostrar que mulher negra e indígena pode estar onde quiser.


Thaciana de Sousa Santos, a Tatá, é estudante de graduação do Instituto de Física da Universidade de São Paulo e escreve semanalmente para o Ciência na Rua

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