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Renato Janine Ribeiro é eleito presidente da SBPC

Herton Escobar, Jornal da USP

Professor da USP e ex-ministro da Educação vai liderar a maior entidade da ciência brasileira pelos próximos dois anos

Renato Janine Ribeiro – Montagem sobre foto de Valter Campanato/EBC e JC Notícias/SBPC

O filósofo Renato Janine Ribeiro, professor titular da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP) e ex-ministro da Educação, será o novo presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) pelos próximos dois anos. Ele foi eleito nesta terça-feira, 22 de junho, com 1.205 votos (63% do total), em uma eleição que contou com a adesão de 60% dos sócios da entidade (o maior índice dos últimos dez anos). As duas vagas de vice-presidência serão ocupadas pela socióloga Fernanda Sobral, professora aposentada da Universidade de Brasília, e pelo físico Paulo Artaxo, professor titular do Instituto de Física da USP — que receberam 1.116 e 683 votos, respectivamente, num total de quatro candidatos.

“Agora é hora de unir todo mundo”, disse Ribeiro ao Jornal da USP. “Temos todos os mesmos ideais. Além da Ciência, que está no seu nome, a SBPC tem a ver com Educação, Tecnologia, Saúde, Meio Ambiente, inclusão social; um pacote de tudo que pode contribuir para o futuro do Brasil”, completou o filósofo. “Quando a gente voltar a se desenvolver e voltar a ter futuro, precisaremos juntar todos esses elementos de novo. Temos muitas dificuldades e muito trabalho pela frente.”

Acadêmico, escritor e intelectual renomado, Ribeiro já foi ministro da Educação, em 2015, e diretor de Avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), de 2004 a 2008 — um dos cargos mais importantes da pós-graduação brasileira. Foi a segunda vez que ele concorreu à presidência da SBPC, em disputa com o neurocientista Carlos Alexandre Netto, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A primeira candidatura foi em 2003, quando perdeu uma disputa apertada com o físico Ennio Candotti (veja a lista completa da diretorias anteriores da entidade abaixo).

Maior entidade representativa da ciência no País, a SBPC tem cerca de 3.500 sócios, 165 entidades científicas afiliadas, e realiza eleições a cada dois anos. Desde 2011, essa é a primeira vez que a disputa teve mais de um candidato; o que “mostra a vitalidade da instituição e assegura a diversidade de opiniões”, segundo o bioquímico Walter Colli, professor aposentado do Instituto de Química da USP, que presidiu a comissão eleitoral da SBPC (leia o comentário completo dele abaixo).

Fundada em 1948, a SBPC desempenha um papel crucial de representação da sociedade civil em prol da ciência e da educação no Brasil. Durante a ditadura militar, também atuou fortemente em defesa da democracia e das Diretas Já, como relata essa edição especial do Jornal da Ciência, de dezembro de 2018, sobre os 70 anos da entidade.

Ribeiro elogiou a atual gestão da SBPC, liderada desde 2017 pelo físico Ildeu de Castro Moreira, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e disse que pretende “ampliar e dar continuidade” ao trabalho que vem sendo feito. Nos últimos anos a SBPC liderou diversas iniciativas públicas de protesto contra os cortes de verbas e bolsas para pesquisa no País e ampliou sua atuação junto aos três poderes da República, em colaboração com a Academia Brasileira de Ciências e outras entidades do setor. Um dos principais projetos foi a criação da Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento (ictp.br), que pressionou fortemente, por exemplo, com sucesso, pelo descontingenciamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), no fim de 2020. Também uniu forças com entidades religiosas, do direito e da imprensa nacional para formar um Pacto pela Vida e criar o Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade. 

“Temos que trabalhar com todos os segmentos e muitos mais ainda”, defendeu Ribeiro, ressaltando o momento desafiador que o Brasil enfrenta atualmente. “Não tem mais essa história de conflito entre civilização e barbárie; hoje o conflito é de vida versus morte; a coisa ficou mais drástica ainda.”

“A SBPC é uma instituição absolutamente chave nesse momento crítico que estamos vivendo, de destruição de diversas estruturas que foram concebidas ao longo de décadas — estruturas científicas, acadêmicas, jurídicas, sociais e políticas”, analisa Paulo Artaxo, que também é vice-presidente da Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp) e agora vai compartilhar a vice-presidência da SBPC com a professora Fernanda Sobral (que segue para o seu segundo mandato na entidade). “É um grau de destruição sem precedentes na história do Brasil”, ressalta o professor. Mesmo na ditadura, segundo ele, os militares preservaram as universidades, as agências de fomento e os institutos de pesquisa, “porque sabiam que a Ciência e a Tecnologia são essenciais para o desenvolvimento econômico do País”.

O orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações é o menor da história, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) está quase falido e o governo fez uma manobra política de última hora, na votação do orçamento deste ano, para evitar o descontingenciamento do FNDCT que havia sido aprovado no Congresso. Várias universidades e institutos de pesquisa federais já alertaram que não possuem recursos suficientes para se manter funcionando plenamente até o fim do ano. “A repressão era maior na ditadura, mas as instituições foram minimamente preservadas. Agora, nem isso”, afirma Artaxo. “A SBPC vai empenhar todos os esforços para recompor esses orçamentos e lutar contra a destruição da nossa fraca democracia.”

Além da presidência e duas vice-presidências, foram preenchidos na eleição seis cargos de secretaria e tesouraria, que juntos compõem a diretoria da entidade. De um total de nove eleitos, sete são mulheres — um recorde nos 73 anos de história da SBPC, que já teve três presidentas (Carolina Bori, Glaci Zancan e Helena Nader). São elas: Claudia Linhares Sales (secretária-geral); Miriam Pillar Grossi, Laila Salmen Espíndola e Francilene Procópio Garcia (secretárias); Marimélia Porcionatto e Ana Tereza de Vasconcelos (primeira e segunda tesoureiras).

Todos os eleitos serão empossados no dia 23 de julho, durante a tradicional Reunião Anual da SBPC, que este ano será realizada de forma virtual, em função da pandemia.

Ilustração publicada na edição de dezembro de 2018 do Jornal da Ciência, em homenagem aos 70 anos da SBPC, com caricaturas de Kleber Sales: https://bit.ly/3qhCWyB. (Atualização: Ildeu Moreira também foi presidente entre os anos de 2019 e 2021)

 

“Eleição mostra vitalidade da instituição”

A SBPC nasceu em 1948 da necessidade que os cientistas têm de comunicar-se. A ideia de juntar todas as disciplinas sob a égide de uma instituição que sempre promoveu uma reunião anual, integrou profissionais da educação de diversas áreas. É interessante notar como fatos como esse nunca vêm isolados. É preciso lembrar que pouco mais de um ano depois fundou-se o CNPq, Conselho Nacional de Pesquisas, agora denominado Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e, logo depois, a Capes, acrônimo para Campanha de Aperfeiçoamento do Pessoal de Ensino Superior e que, mais tarde, mudou o nome para Coordenação. A SBPC foi, portanto, uma instituição da sociedade civil que acompanhou, influiu e participou dessas iniciativas e das que viriam mais tarde, como as decorrentes do Parecer Sucupira que desembocaram na criação da Pós-Graduação e promoveram a Reforma Universitária, na década de 1960. Alguns que foram presidentes da SBPC foram membros do Conselho Federal de Educação nessa época.

Havia cientistas no Brasil desde o começo do século XX, mas foi a SBPC a instituição que emprestou organicidade à atividade científica, já que essa não é uma profissão com diploma profissional específico. Vão para a ciência aqueles que indagam, querem responder a perguntas e querem formar cidadãos com conhecimento mais ou menos especializado.

A SBPC foi sempre uma sociedade que manteve procedimentos democráticos desde a sua constituição. Teve que imiscuir-se na política nacional quando se quebrou a ordem institucional no País. Desde então, ela se tornou imprescindível em defesa da ciência e da cultura, uma vez que não são poucas as iniciativas políticas – aí incluído o aperto nas verbas concedidas – tendentes ao retrocesso. É forçoso lembrar, agora que tanto se discute a inserção feminina em ambientes predominantemente masculinos, que a SBPC eximiu-se de discriminar gêneros, bastando lembrar suas ótimas presidentes Carolina Martuscelli Bori (1987-1989), Glaci Therezinha Zancan (1999 a 2003) e Helena Bonciani Nader (2011 a 2017).

Por isso, a atual eleição, que se repete de dois em dois anos, é um ato democrático e bastante participativo, uma vez que houve o maior percentual de comparecimento desde 2009. O fato de ter havido disputa para alguns cargos mostra a vitalidade da instituição e assegura a diversidade de opiniões. Serve como exemplo. No entanto, terminado o pleito, todos estarão unidos novamente para promover Cultura, Ciência e Educação. E defendê-las, se preciso for.

Por Walter Colli, professor titular (aposentado) do Instituto de Química da USP e presidente da Comissão Eleitoral da SBPC (2021)

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