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Casos não registrados de covid-19 facilitam a disseminação rápida do vírus
Covid-19

por | 20 mar 2020

Imagem colorizada de microscopia eletrônica mostra uma célula apoptótica (azul) gravemente infectada por partículas do vírus Sars-CoV-2 (amarelo) – crédito: NIAID

Artigo científico publicado na revista Science no último dia 16 demonstra que a disseminação do vírus causador da covid-19 é facilitada pela ausência de registro de casos de infecção. O estudo reuniu pesquisadores do Imperial College London (Inglaterra), Universidade Columbia (EUA), Universidade da Califórnia (EUA), Universidade de Hong Kong e Universidade Tsinghua (China).

Os cientistas desenvolveram um modelo matemático que simula a dinâmica espaço-temporal de infecções entre 475 cidades chinesas. No modelo, as infecções foram divididas em dois tipos: indivíduos infectados registrados com sintomas severos o bastante para que se confirmasse estarem com covid-19 e indivíduos infectados não registrados. Cada um desses tipos tem sua própria taxa de transmissão.

A propagação do vírus entre diferentes cidades foi medida pelo número diário de pessoas viajando entre uma cidade e outra, com um fator multiplicador. Esse número se baseou na quantidade de viagens entre essas 375 cidades durante o Festival da Primavera de 2018, um período de 40 dias (15 dias antes e 25 depois do ano novo lunar), que, em 2020, se iniciou em 10 de janeiro.

Para inferir a dinâmica de transmissão do Sars-CoV-2 durante o começo do surto, os pesquisadores simularam observações entre 10 e 23 de janeiro, antes do início de restrições a viagens, e estimaram as trajetórias de quatro variáveis: pessoas suscetíveis, pessoas expostas, pessoas infectadas registradas e subpopulações infectadas sem registro.

Resultados

Uma primeira simulação indicou que 86% dos casos entre 10 e 23 de janeiro não foram registrados, cálculo corroborado pela taxa de infecção entre estrangeiros evacuados de Wuhan. O estudo estimou que esses casos não registrados tiveram um nível de contágio próximo da metade do nível de contágio dos casos registrados (mais precisamente, 55%).

Outra simulação estimou que 86,2% dos quase 17 mil novos casos nesse período se originaram de casos não registrados. Para se aprofundar no impacto do contágio por casos não registrados, os pesquisadores simularam surtos hipotéticos em que esses casos não fossem mais contagiosos e constataram que, nesse cenário, o número de contágios na China seria 78,8% menor e, em Wuhan, 66,1% menor. Essa descoberta permitiu a conclusão de que os casos não registrados facilitaram a disseminação geográfica do vírus na China.

A equipe também modelou a transmissão na China após 23 de janeiro, quando foram adotadas medidas mais drásticas de controle, como proibição de viagens entre outras cidades grandes e Wuhan, precauções contra contato social, auto-quarentena, além da disponibilização de mais kits para teste. Essas medidas, junto com a maior consciência da população sobre o problema e a consquente adoção de medidas de proteção pessoal (uso de máscaras, distanciamento social, auto-isolamento quando doente etc.) provavelmente alteraram as características epidemiológicas do surto, diz o artigo.

Funcionários desinfetam os ônibus em Yichang, província de Hubei, na China (Foto: PRCHINA/FotosPublicas)

Novas simulações foram feitas para o período entre 24 de janeiro e 8 de fevereiro: um cenário considerava reduções de 98% das viagens saindo ou chegando de Wuhan e 80% das viagens entre todas as outras cidades. A proporção de casos registrados nesse período com controles mais rígidos passou de 14% a 65%. A taxa de reprodução, ou seja, quantas pessoas são contagiadas por uma pessoa previamente contagiada, caiu de 2,38 para 0,99.

O estudo concluiu que o aumento da identificação e isolamento de casos é necessário para o controle do Sars-CoV-2 e que a maior atenção da população, cobertura intensa por parte da imprensa e as ações do poder público ajudaram a diminuir a proporção de casos não registrados e frearam o avanço da epidemia. O artigo alerta ainda que a situação se altera a cada dia, e que novas medidas podem ser necessárias para evitar um novo aumento dos casos.

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