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A vida secreta dos ácaros em nosso rosto
Biologia

por | 24 jun 2022

Pesquisa indica que invertebrados poderão viver em simbiose com humanos

Ácaros microscópicos que vivem nos poros humanos e acasalam em nossos rostos estão se tornando organismos tão simplificados por causa de seu estlo de vida inusual que em breve poderão ser parte de nós, segundo uma pesquisa publicada na revista Molecular Biology Evolution.

Os ácaros são adquiridos geralmente ainda durante o parto ou na amamentação e são então carregados por quase todo ser humano ao longo da vida, com os números aumentando em adultos, conforme os poros aumentam de tamanho. Os pequenos aracnídeos têm 0,3 milímetro de comprimento e são encontrados em folículos do rosto, dos mamilos, nos cílios, e se alimentam do sebo liberado naturalmente pelas células nos poros. Eles ficam ativos durante a noite e se deslocam entre folículos buscando acasalar.

O primeiro estudo de sequenciamento genômico do ácaro Demodex folliculorum descobriu que sua existência isolada e consequente endogamia – o cruzamento entre indivíduos aparentados – estão fazendo com que esses ácaros percam genes e células desnecessários e rumando a uma transição da condição de parasitas externos para a de simbiontes internos, ou seja, organismos que vivem em simbiose com outros. Não é a única espécie de ácaro que levamos em nossa pele – há também a Demodex brevis, que vive nas glândulas sebáceas, enquanto a D. folliculorum habita os folículos pilosos.

“Descobrimos que esses ácaros têm um arranjo diferente dos genes de partes do corpo em relação a outras espécies devido à sua adaptação a uma vida abrigada no interior dos poros. Essa alteração no DNA os levou a ter características e comportamentos incomuns”, explica Alejandra Perrotti, professora de biologia de invertebrados na Universidade de Reading, no Reino Unido, e co-líder da pesquisa.

Devido ao isolamento, sem ameaças externas, sem competição para infectar hospedeiros e sem encontros com outros ácaros com genes diferentes, a redução genética tornou-os seres muito simples, com perninhas minúsculas impulsionadas por músculos de apenas três células. Por isso, eles necessitam muito pouca proteína, a menor quantidade observada entre espécies relacionadas. A redução genética também é responsável pelos hábitos noturnos: os ácaros não têm proteção contra raios ultravioleta e perderam a capacidade de produzir melatonina, substância que em geral torna os invertebrados ativos à noite. Em vez disso, como combustível para suas noites de acasalamento, usam a melatonina secretada pela pele humana.

Outras características chamaram a atenção dos pesquisadores. Por exemplo, seus órgãos reprodutivos se deslocaram para a frente do corpo: o pênis do macho fica no dorso, obrigando-o a ficar sob a fêmea enquanto acasalam. Também foi observado que os indivíduos jovens têm mais células do que os adultos, o que, segundo os pesquisadores, é o primeiro passo para que a espécie se torne simbionte.

Destaque do pênis dorsal do Demodex folliculorum (magem: Universidade de Reading)

Também foi constatado que a espécie possui ânus – antes, acreditava-se que não possuíam e acumulavam fezes durante todo o ciclo de vida, liberando-a apenas quando morriam, o que causaria inflamações na pele do hospedeiro. A constatação demonstrou que a acusação era injusta.

De acordo com a pesquisa, a ausência de exposição a potenciais parceiros reprodutivos que poderiam incrementar a variabilidade genética dos descendentes pode estar levando a espécie a um beco sem saída em termos de evolução, com risco inclusive de extinção. Isso já foi observado em bactérias vivendo no interior de células, mas nunca em um animal.

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