Universidade do Alaska em Fairbanks
Tradução e adaptação: Tiago Marconi
Pesquisadores usaram isótopos da presa do animal para mapear os caminhos que percorreu
Uma equipe internacional de pesquisadores reconstituiu a impressionante jornada da vida de um mamute-lanoso (Mammuthus primigenius) do Ártico, que percorreu nas paisagens do Alasca o equivalente a quase duas voltas na Terra.
Cientistas reuniram detalhes sem precedentes da vida do animal através da análise de um fóssil de 17 mil anos do Museu do Norte, da Universidade do Alasca, nos Estados Unidos. Gerando e estudando dados isotópicos da presa do mamute, eles puderam comparar seus movimentos e sua dieta com os mapas isotópicos da região.
Poucos detalhes das vidas dos mamutes-lanosos são conhecidos, e o estudo oferece uma primeira evidência de que eles viajavam longas distâncias. Um esboço da vida do animal está detalhado na nova edição da revista Science.
“Não está claro que ele era um migrante sasonal, mas andava muito”, contou o Matthew Wooller, pesquisador da Universidade do Alasca em Fairbanks e um dos autores principais do artigo. “Visitou muitas partes do Alasca em algum momento da vda, o que é incrível quando se pensa o quão grande é a área.”
Pesquisadores do Alaska Stable Isotope Facility, onde Wooller é diretor, partiram a presa de cerca de 1,8m longitudinalmente e geraram aproximadamente 400 mil pontos de dados microscópicos utilizando um laser e outras técnicas.
As análises detalhadas que eles fizeram é possível pela forma como a presa do mamute crescia: adicionando regularmente, a cada dia, novas camadas ao longo de sua vida. Quando ela foi partida para a amostragem, essas faixas de crescimento pareciam casquinhas de sorvete empilhadas, oferecendo um registro cronológico da vida inteira do mamute.
“Do momento em que nasceram até o dia de sua morte, eles têm um diário, e ele está escrito em suas presas”, disse Pat Druckenmiller. palentólogo e diretor do Museu do Norte. “A Mãe Natureza não costuma oferecer registros tão convenientes sobre a vida inteira de um indivíduo.”
Cientistas sabiam que o mamute morreu na região de North Slope, acima do Círculo Polar Ártico, onde seus restos foram escavados por uma equipe que incluía Dan Mann e Pam Groves, da Universidade do Alasca em Fairbanks, entre os co-autores do estudo.
Os pesquisadores reconstruíram a jornada até aquele lugar analisando assinaturas isotópicas dos elementos estrôncio e oxigênio em sua presa, que eram comparadas com mapas de previsão de variação de isótopos no Alasca. Esses mapas foram criados a partir da análise de dentes de centenas de pequenos roedores alasquianos que fazem parte das coleções do museu. Esses animais viajam distâncias relativamente pequenas durante suas vidas e apresentam sinais de isótopos locais.
Usando esse conjunto de dados, os cientistas mapearam a variação de isótopos no Alasca, provendo um padrão para traçar os movimentos do mamute. Após considerarem barreiras geográficas e a distância que o animal viajava a cada semana, os pesquisadores usaram uma nova abordagem de modelagem espacial para projetar suas rotas prováveis ao longo da vida.
O DNA preservado nos restos do mamute permitiu à equipe identificá-lo como um macho aparentado com o último grande grupo da espécie que viveu na porção continental do Alasca. Esses detalhes possibilitaram um maior entendimento da vida e do comportamento do animal, disse Beth Shapiro, que liderou os estudos com DNA da pesquisa.
Por exemplo, um desvio abrupto em sua assinatura isotópica, ecologia e movimento perto dos 15 anos de vida provavelmente coincidiu com o mamute ter sido expulso de sua manada, espelhando um padrão observado em alguns elefantes machos atuais.
“Saber que ele era macho forneceu um contexto biológico melhor para podermos interpretar os dados istópicos”, disse Shapiro, que é professora da Universidade da Califórnia em Santa Cruz e pesquisadora no Instituto Médico Howard Hughes, ambos nos Estados Unidos.
Os isótopos também ofereceram uma pista sobre o que levou o animal à morte. Os isótopos de nitrogênio tiveram um grande aumento durante o inverno final de sua vida, um sinal que pode indicar inanição em mamíferos.
“É impressionante o que pudemos ver e fazer com esses dados”, disse o co-autor principal Clement Bataille, pesquisador da Universidade de Ottawa, no Canadá, que liderou o trabalho de modelagem em colaboração com Amy Willis, da Universidade de Washington, nos Estados Unidos.
Descobrir mais sobre as vidas de espécies extintas faz mais do que satisfazer curiosidade, disse Wooller, da Universidade do Alasca. Esses detalhes podem ser surpreendentemente relevantes hoje, conforme muitas espécies adaptam seus padrões e áreas de movimento em reação ao clima que está mudando.
“O Ártico está vendo uma série de mudanças agora, e podemos usar o passado para ver como o futuro se desenrolará para espécies agora e no futuro”, disse Wooller. “Tentar resolver essa história de detetive é um exemplo de como os ecossistemas de nosso planeta reagem face à modificação ambiental.”
Outras instituições que contribuíram para o estudo incluem a Universidade Estadual da Flórida e o Serviço Nacional de Parques (Estados Unidos), a Universidade de Loeben (Áustria) e a Universidade de Laiocheng (China).