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Salada de monstros

Texto: Alberto Díaz Añel
Tradução e adaptação: Tiago Marconi

Audrey II (Levi Stubs) e Ellen Green, em ‘A pequena loja dos horrores’ – 1986  (The Geffen Company e Warner)

Hoje vamos descansar um pouco dos vírus e dos monstros que se parecem com a gente ou com algum animal perigoso. Alguém já pensou que as plantas poderiam ser monstruosas?

Por que não? São seres tão vivos quanto a gente (inclusive mais que um vírus!) e reagem de diferentes formas ao meio ambiente que as cerca. Por mais estáticas que pareçam, elas se movem ao ritmo do sol, do ar e inclusive da força da gravidade. E, em muitos casos, sua fonte de energia não são apenas o sol e os nutrientes do solo.

Videira procurando apoio (imagem: u/Mass1m01973)

Vejamos: uma das características principais dos monstros é sua feiura (não seria o caso de Dorian Gray, ali a feiura é interior). Existem plantas feias? Difícil dizer, mas quase todas as plantas têm seu lado bonito (falando da aparência, porque se se falarmos do cheiro…). Um cacto espinhoso ou um cardo fibroso também podem ter seu lado bonito.

Os monstros em geral têm um alto grau de maldade. Em alguns casos, é inata, mas em outros tem certa justificativa. Drácula e o lobisomem precisam se alimentar de sangue ou carne crua para viver; o monstro de Frankenstein apenas reage ao repúdio da sociedade que o agride constantemente; a múmia e o monstro da Lagoa Negra defendem suas moradas contra invasão, seja uma tumba secreta ou um pântano amazônico. As plantas podem ser más? Duvidamos muito. Podem nos causar danos? Algumas sim, mas não fazem de propósito… Ou fazem?

Borboleta monarca (Danaus plexippus) pousada sobre flor de cardo (Cirsium vulgare) e cacto saguaro (Carnegiea gigantea) – fotos: Sean Stratton e Christoph von Gellhorn – Unsplash

Apesar de não compartilharem das características típicas de um monstro, houve quem imaginasse plantas monstruosas. Talvez inspirados nas plantas carnívoras, que são inofensivas para nós, mas mortais para os insetos, ou naquelas plantas que, além de belas flores e saborosos frutos, podem produzir compostos tão tóxicos que podem afetar nosso sistema nervoso e inclusive nos matar.

Claro, quando não há feiura ou maldade, ajuda muito que o tamanho do monstro seja grande o suficiente para nos assustar. E esse recurso foi muito utilizado com as plantas. Se somarmos a isso a possibilidade de vegetais carnívoros, podemos perfeitamente nos imaginar como suas vítimas (ou melhor, seu alimento). Também está claro que, se não podem nos comer de uma vez só, vem a calhar sua capacidade de produzir substâncias tóxicas ou alucinógenas para nos eliminar de uma maneira mais sutil e não tão desagradável quanto uma mordida com posterior deglutição.

Por que não fazemos uma recapitulação das plantas monstruosas mais famosas da literatura e do cinema e, de quebra, conhecemos um pouco mais sobre as plantas que nos acompanham na vida real?

Uma das plantas monstruosas mais famosas teve sua origem nos filmes B, que por sua vez inspirou uma comédia musical muito famosa, na qual se baseou outro filme não tão exitoso mas que se tornou cult. Estamos falando de ‘A pequena loja dos horrores’, que teve seu maior sucesso como musical em 1982 e gerou o famoso filme realizado em 1986.

Embora os personagens da história sejam poucos, a protagonista sem dúvidas é uma planta, Audrey II (Audrey Segunda), que, para crescer, precisa se alimentar de humanos. que são fornecidos por um empregado da floricultura onde ela vive. Como dizíamos mais acima, o tamanho é importante e, no caso de Audrey II, é impressionante (e necessário para comer humanos com uma só mordida).

Apanha-moscas (via giphy)

Sem dúvidas, sua imagem (não seu tamanho, por sorte) foi baseada em uma das plantas carnívoras mais conhecidas, a apanha-moscas (Dionea muscipula). Essas plantas têm algumas de suas folhas modificadas para formar dois “lóbulos” unidos por uma espécie de dobradiça. No interior desses lóbulos há pelos altamente sensíveis chamados tricomas. Quando um inseto ou uma aranha (também pequenas lagartas, moluscos ou batráquios) tocam dois desses tricomas em menos de 20 segundos, em um décimo de segundo os lóbulos se fecham, apanhando o visitante indefeso. Por que têm que tocar dois tricomas nesse período? Porque, se fossem mais sensíveis, uma simples gota de chuva ativaria a armadilha, o que seria pouco eficiente para a planta. Esses lóbulos, por sua vez, possuem em suas bordas cílios que, quando a armadilha se fecha, se entrelaçam para formar uma espécie de prisão intransponível para a vítima, que será digerida num intervalo de 10 dias. Esses lóbulos que abrem e fecham para a planta se alimentar, somados à presença dos cílios, dão à apanha-moscas o aspecto de uma boca dentada, que lembra muito a Audrey II, com a diferença de que essa tinha dentes de verdade em vez de cílios.

Cartaz de ‘O ataque dos tomates assassinos’ – 1978 (Four Square Productions)

E se falamos de plantas assassinas, não podemos deixar de lado um de seus produtos, os frutos, que também tiveram seu protagonismo monstruoso. Em 1978, estreou um filme B que, apesar das péssimas críticas que recebeu, teve três sequências, séries animadas e videogames. Trata-se de ‘O ataque dos tomates assassinos’, em que um grupo de tomates gigantescos ataca a humanidade para conquistar o mundo. Esses perigosos frutos carecem de qualquer traço humanizado (não têm boca nem dentes como Audrey II) e, na verdade, não fica muito clara sua forma de matar (a menos que seja por esmagamento). De todo modo (spoiler alert!), nem o exército mais treinado do mundo pode com eles. Quando tudo parece perdido, aparece a arma que conduz à sua aniquilação: uma canção que os reduz ao tamanho normal, permitindo que sejam esmagados com um simples pisão.

Mas voltemos à vida real. O tomate é o fruto da planta Solanum lycopersicum, que é uma parente muito próxima da batata e da berinjela. É originária da América Central e da parte norte da América do Sul. Seu nome vem da palavra nauatle (o idioma do astecas) xīctomatl, algo como “fruto com umbigo”. Na verdade, esse nome se aplicava mais ao tomate grande e vermelho (com “umbigo”), conhecido como jitomate [lembrando que o j em espanhol tem som de r aspirado – “ritomate”] em algumas partes da América, enquanto o nome tomate se utiliza mais comumente com os verdes pequenos, também conhecidos como tomatillos [nota do tradutor: no Brasil, são conhecidos como tomates mexicanos, entre outros nomes].

Acredita-se que seu uso na cozinha remonta a mais de dois milênios e meio, mas sua fama culinária sem dúvidas nasceu quando chegou à Europa no século XVI. Um dos primeiros países a adotá-lo foi a Itália, e como os primeiros tomates que chegaram lá eram amarelos, chamaram-lhe “maçã dourada” ou pomo d’oro. Daí o nome que tem atualmente na península italiana (independente da cor): pomodoro.

Variedades de tomates (foto: pxfuel)

Não vamos nos estender sobre as propriedades desse fruto, que se cultiva atualmente em todo o mundo, mas cabe destacar de seu conteúdo em vitaminas e antioxidantes, as numerosas variedades cultivadas que existem (com diversas cores e que podem medir entre um e mais de dez centímetros de diâmetro), e a infinidade de comidas que o têm como protagonista.

Pi observando os peixes mortos pela acidificação da água da ilha das plantas carnívoras (Fox)

E se falamos de plantas carnívoras, não podemos deixar de lembrar uma cena do filme recente ‘A vida de Pi’, baseada na vida do escritor canadense Yann Martel, que estreou em 2012. Nele, o protagonista Piscine Patel, e seu acompanhante, o tigre Richard Parker, chegam a uma ilha flutuante feita de plantas comestíveis e povoada por suricatos. Mas à noite a ilha sofre uma mudança radical, sua água se converte em ácido e algo estranho ocorre com as plantas. Piscine (ou Pi) descobre um dente dentro de uma flor e deduz que as plantas são carnívoras, e que a acidificação da água é simplesmente para favorecer a digestão de suas vítimas. Alerta de spoiler! Por sorte, ambos podem fugir sãos e salvos da ilha “paradisiaca”.

Nos anos 1960 e 1970 estiveram muito em moda no cinema as plantas vindas do espaço exterior (outra grande desculpa para criar monstros). Assim surgiram ‘O terror veio do espaço’ (1962) e ‘Invasores de corpos’ (1978). No primeiro, as plantas de dois a três metros de altura são capazes de andar com suas raízes, abraçar com seus galhos (não por carinho) e se alimentar de restos humanos após atacarem suas vítimas com um veneno mortal que trazem em um longo espinho. Alerta de Spoiler! Acabam dominando o mundo, enquanto o que sobra da humanidade fica presa em uma ilha com a esperança de um dia recuperar o planeta. Embora o filme sugira que as sementes das plantas chegaram do espaço, no romance original de 1951, do escritor britânico John Wyndham, quem criou as sementes foram os soviéticos, com o objetivo de conseguir um óleo vegetal com propriedades extraordinárias. Pena que algumas sementes se espalharam por outras partes do mundo como uma pandemia viral (qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência).

Cartazes de ‘Invasores de corpos’ – 1978 (Solofilm) e ‘O terror veio do espaço’ – 1962 (Allied Artists Pictures e Security Pictures)

As que vieram mesmo do espaço foram as sementes das protagonistas de ‘Invasores de corpos’. O plano desses monstros vegetais era liberar uma substância que adormecesse as pessoas e fazer uma cópia exata de suas vítimas enquanto dormiam. Uma vez terminada a cópia, o original se desintegrava e era substituído por alguém idêntico mas sem emoções humanas. Alerta de spoiiler! Nem tudo termina bem para a gente. É importante esclarecer que a história é inspirada no romance ‘Os invasores de corpos’ (1955), do escritor americano Jack Finney. E verdade que houve um filme anterior, em 1956, e outro posterior, em 1993, mas nenhum teve o brilhante elenco do filme de 1978 que, apesar de não ter tido tanto sucesso nas bilheterias, se tornou um filme cult para os amantes do terror.

Inseto caindo na armadilha de uma Nepenthes

Não é uma ideia maluca, essa da digestão das plantas (que andem ou que dupliquem corpos humanos, sim, é). Sabemos que existem numerosas plantas carnívoras que secretam proteínas que ajudam a digerir seus alimentos. Por exemplo, a apanha-moscas, de que falamos antes, secreta substâncias que degradam as proteínas de suas presas para poder digeri-las. Muitas outras plantas desse tipo como as Nepenthes, evoluiram a ponto de possuir proteínas enzimáticas, conhecidas como quitinases, que degradam a cobertura externa dos insetos, composta principalmente por quitina, um hidrato de carbono derivado da glucose que também faz parte das paredes celulares dos fungos, da “armadura” dos crustáceos (como caranguejos e camarões) e das escamas dos peixes. Muitas dessas plantas também possuem outro tipo de proteínas digestoras chamadas fosfatases ácidas, que permitem subtrair o fósforo, essencial para seu crescimento, de suas vítimas em decomposição.

Sigamos com as plantas e o cinema, para falar de um filme um pouco mais atual, ‘The happening’ ou ‘Fim dos tempos’ do diretor M. Night Shyamalan, que estreou em 2008. Nessa história, uma onda de suicídios sem causa aparente surpreende o noroeste dos Estados Unidos. Muitos pensam que se trata de um ataque bioterrorista, e não estão tão longe da realidade. A única diferença é que dessa vez os terroristas não são humanos, mas plantas. Aparentemente, certas plantas foram capazes de desenvolver um mecanismo de defesa (contra nós) liberando no ar uma toxina capaz de alterar os neurotransmissores do cérebro e levar o intoxicado diretamente ao suicídio. Embora tudo se resolva sem uma explicação muito clara (Shyamalan, corre aqui), no fim do filme – spoiler alert! – outro surto de suicídios começa na França. Parece que as plantas sempre terminam nos vencendo (diferente dos frutos).

Indo muito, mas muito mais atrás (uns dois mil e oitocentos anos), temos relatos que descrevem plantas capazes de dominar a vontade das pessoas, como é o caso dos lotófagos (comedores de lótus) da Odisseia, de Homero. Nessa etapa da viagem épica que a obra narra, seu protagonista, Ulisses, e seus homens se encontram com uma civilização que se alimentava da fruta da árvore de lótus, uma planta que não se conhece atualmente e que não se sabe se realmente existiu. Os companheiros de Ulisses provam esse delicioso manjar, que lhes produz um estado de adormecimento, lhes faz esquecer suas famílias e amigos e lhes gera a necessidade imperiosa de viver ali e não regressar a seus lares. Ulisses, como sempre tomando conta da situação, devolve os homens a seu barco, apesar das queixas e choro, e os mantém amarrados até que se afastem desse lugar curioso.

Em gravura do século XVIII, Ulisses arrasta seus homens para fora da terra dos comedores de lótus

Pois bem, podem as plantas alterar nossa vontade? Talvez não a partir de toxinas que viajem pelo ar e induzam ao suicídio, mas podem, sim, produzir substâncias que alterem nossa realidade quando as consumimos de diferentes maneiras. Como sempre, tudo depende da dose. Muitas dessas substâncias são psicoativas (afetam nosso sistema nervoso e modificam suas funções) quando utilizadas em pequenas doses, ao passo que, em grandes quantidades, em geral são mortais ou incapacitantes.

Da esquerda para a direita e de cima para baixo: trombetas (BrugmansiaRiala/Pixabay), papoula (Papaver somniferum – Manuel M.V. – CC BY 2.0), peiote (Lophophora williamsiiDav Hir – CC-BY-SA 3.0) e “cogumelo mágico” (Psilocybe cubensis – Alan Rockefeller – CC BY 2.0)

Exemplos típicos de substâncias psicoativas de origem vegetal são a atropina, a beladona e a escopolamina, que podem ser obtidas do estramônio, ou Datura stramonium, ou trombeta, ou zabumba, que pertencem a um grupo de plantas conhecidas como Brugmansia. A morfina, a heroína, a codeína e a tebaína são parte do ópio, que é o látex que se extrai das cápsulas de sementes da papoula dormideira (Papaver somniferum). Também são muito conhecidos os canabinoides, sobretudo o THC ou tetrahidrocanabinol, produzidos pela planta de maconha (Cannabis sativa) e a cocaína, que se extrai da planta de coca, ou Erythroxylum coca. Não podemos nos esquecer do peiote (Lophophora wiliamsii), um cacto típico do México que produz a substância alucinógena conhecida como mescalina, nem dos fungos alucinógenos como o cogumelo mágico (Psilocybe cubensis), que fabricam principalmente um composto psicoativo chamado psilocibina.

Muitas dessas substâncias (obtidas tanto de plantas quanto de fungos) foram e são utilizadas por xamãs e curandeiros de povos originários em todo o mundo, seja com fins medicinais ou para se comunicar com os espíritos. Quando puderem, visitem no Museu Botânico de Córdoba a mostra “Plantas dos deuses”, onde são descritas com clareza as propriedades dessas substâncias e os usos que os povos originários do continente americano lhes deram. [Nota do tradutor: a única coisa um pouco parecida que encontrei no Brasil, pesquisando para adaptar este texto, é uma área do Jardim Botânico de Salvador, na Bahia, que apresenta as plantas sagradas do candomblé. Caso algum leitor conheça outra iniciativa do tipo no país, nos avise, que incluiremos no texto].

E, se falamos de monstros e plantas, é interessante saber que os extratos de algumas espécies de Datura (ricas em atropina, beladona e escopolamina) eram utilizados em cerimônias vodu no Haiti e faziam parte do que se conhecia como “pó zumbi”. Esse pó era administrado a pessoas que participavam desse tipo de cerimônia, causando alucinações e amnésia. Outro componente da mistura era a tetrodotoxina, que pode ser encontrada no fígado do baiacu (sim, essa comida tão perigosa apreciada no Japão). Essa droga, na dose adequada, pode causar catalepsia, estado em que a pessoa parece estar morta, com seus sinais vitais quase imperceptíveis. A administração desse pó levava quem o ingerisse a parecer morto, para um tempo depois voltar à vida. Quando isso ocorria, a pessoa afetada parecia não ter vontade própria, seguindo qualquer tipo de ordem sem protestar. Esse tipo de cerimônia deu origem a lendas de zumbis que nos perseguem todo dia no cinema, na TV e na literatura. Pequeno acréscimo: acredita-se que a palavra zumbi tem sua origem na África, de onde veio grande parte dos ancestrais da população haitiana atual, e seu significado seria algo como “espírito de uma pessoa morta” ou “morto que caminha”.

Ilustração de 1864 de ‘Viagem ao centro da Terra’, por Édouard Riou

Também podemos encontrar plantas anormalmente grandes no romance de 1904 de H.G. Wells ‘O alimento dos deuses’, e fungos (que não são plantas, mas estão muito associados a elas na natureza) de vários metros de altura em ‘Viagem ao centro da Terra’, romance publicado em 1864 e escrita por Julio Verne. Embora esses exemplares possam parecer monstruosos, isso é apenas por seu tamanho, já que nesses livros os verdadeiros monstros são humanos, insetos e animais de granja ou dinossauros marinhos já extintos.

E como esquecer os Ents, árvores pastoras de árvores que caminham lentamente e se comunicam em um idioma muito complexo, da saga ‘O Senhor dos Anéis’, de J.R.R. Tolkien; o salgueiro lutador que ataca Harry Potter e seu amigo Ron (e muitas outras plantas estranhas dessa saga, como a mandrágora, associada a muitas lendas antigas), o exército de árvores que ajudam Malévola (a bruxa malvada da Bela Adormecida) a defender sua floresta dos soldados do rei, e o cativante Groot de ‘Os Guardiões da Galáxia’, que não tem nada de monstruoso (ainda que não seja bom irritá-lo), mas é uma planta que fala! Bem, pronuncia uma palavra só, mas diz muito com ela.

Groot, de ‘O Guardião das Galáxias’ – 2014 (Walt Disney Pictures)

Para finalizar, falemos de plantas que se comportam como monstros, mas só em relação a suas semelhantes. Como esse tema aparentemente ainda não é um campeão de bilheteria, vejamos o que acontece na vida real. Assim como nos contaram da presença de vampiros que espreitam a nós, simples mortais, sabemos também que existem plantas vampiras que se alimentam de suas congêneres. Temos o caso de várias plantas parasitas do gênero Cuscuta, que, não possuindo clorofila, não podem obter energia do sol para produzir seu alimento e, por isso, tomam de outras plantas. São como trepadeiras que vão rodeando sua vítima enquanto geram uma raiz extra fora do solo que penetra o caule invadido à maneira dos caninos dos vampiros. Assim, elas conseguem sugar os nutrientes e a água que necessitam para sobreviver. Inclusive chegam a perder sua raiz original quando têm sucesso na tarefa. Os últimos estudos sobre essas plantas demonstraram que elas trocam RNAs mensageiros com suas vítimas, embora não se saiba bem com que propósito. Acredita-se que poderiam utilizar os RNAs forasteiros sugados em seu proveito (síntese de proteínas?) e também que os RNAs que liberam no caule “mordido” poderiam de alguma forma ser utilizados para dominar seus atormentados hóspedes, mediante a fabricação de proteínas próprias da planta vampira.

Plantas “vampiras”: Cuscuta sugando sua vítima (Fabelfroh – CC BY-SA 3.0) e Langsdorffia hipogaea (Fábio Júnio Santos Fonseca – CC BY-SA 3.0)

A Langsdorffia hipogaea é um pouco mais sutil. Essa planta é em geral subterrânea, e só em temporadas secas se pode ver para fora da terra sua flor, que é muito específica, de cor vermelho-sangue, e poderia muito bem estar na lapela do Drácula. O que mais chama a atenção é que em volta dessa flor só há restos de plantas em decomposição e folhas secas. Isso porque, como não pode fotossintetizar, como as Cuscutas que vimos acima, precisa tomar seus nutrientes das plantas que a cercam, o que é feito através da ampla rede de raízes que se estendem debaixo da terra até suas vítimas mais próximas, deixando apenas morte ao redor de suas flores.

E aqui termina essa história de vegetais monstruosos. Pudemos ver que as plantas também podem ser assustadoras, não só na fantasia da literatura e do cinema, mas também na vida real. Por isso tenham muito cuidado e não se esqueçam de regar o ficus ou a samambaia, assim elas não buscarão vingança quando você menos esperar.

 

 

 

 

Ciência Monstruosa é um projeto do pesquisador e comunicador científico argentino Alberto Díaz Añel, que o Ciência na rua está adaptando para o português. Toda sexta-feira, publicamos um texto aqui e nas nossas redes sociais. Confira abaixo os já publicados.

Vampiros: quanto mais longe, melhor (publicado em 3 de julho)
Vampiros e doenças do sangue (publicado em 10 de julho)
Os lobisomens e o crescimento dos pelos (publicado em 17 de julho)
Podemos matar o que não está vivo? (publicado em 24 de julho)
Como o corpo se defende? (publicado em 31 de julho)
O essencial é invisível aos olhos (publicado em 7 de agosto)

À flor da pele (publicado em 14 de agosto)
Ciência Monstruosa: os tijolos da vida (parte 1) (publicado em 21 de agosto)
Ciência Monstruosa: os tijolos da vida (parte 2) (publicado em 28 de agosto)
Raios, rãs e monstros: a faísca que nos dá vida (publicado em 21 de setembro)

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