jornalismo, ciência, juventude e humor
Tem como não falar sobre o Rio Grande do Sul?

por | 14 maio 2024

Eu poderia até tentar falar sobre outros assuntos na coluna desta semana. Mas simplesmente não tem como. Os olhos do Brasil inteiro, e de boa parte do mundo, estão voltados para o estado do Rio Grande do Sul e para as enchentes devastadoras que estão assolando o estado nas últimas semanas. Mais da metade do RS está debaixo d’água. São centenas de mortos e desaparecidos e milhares de desalojados. São diversas reportagens, campanhas de doação e organizações populares trabalhando para ajudar as vítimas e para buscar reconstruir as cidades de lá.

Mas é fundamental falar sobre outro aspecto dessa tragédia: a urgência e a necessidade de adaptar as cidades para que não sofram tanto com os impactos das mudanças climáticas. Tenho dito que, se o Brasil fosse um país sério e verdadeiramente preocupado com as questões climáticas, a tragédia gaúcha deveria ser um ponto de inflexão. O que está acontecendo hoje no Rio Grande do Sul deveria servir para fazer com que todo o país passasse a trabalhar arduamente pela adaptação climática. É claro que, neste momento, as doações, as mobilizações populares e a solidariedade do país todo são fundamentais. As pessoas precisam sobreviver agora. Comer agora. Ter onde dormir agora. Mas não adianta nada todo esse espírito solidário, toda essa visibilidade midiática se as pessoas retornarem para suas casas e suas cidades sem que elas estejam adaptadas para as mudanças climáticas. E, por favor, sem negacionismos aqui. As enchentes do Rio Grande do Sul são consequência direta do avanço dos impactos das mudanças climáticas. É absolutamente inviável dissociar uma coisa da outra.

Porto Alegre, 03/05/2024, Rio Guaíba, usina do gasômetro, em Porto Alegre após chuva intensa (foto: Gilvan Rocha / Agência Brasil)

E mais: andam por aí dizendo que “Não é hora apontar culpados”. Bem, eu digo o seguinte: é sim hora de apontar os responsáveis. O governador do estado, Eduardo Leite (PSDB), viu as águas subirem em outras duas oportunidades. Por que nada foi feito? Por que as cidades não foram adaptadas? Por que não se criou um plano de adaptação? Vale lembrar que o mesmo governador alterou quase quinhentas (sim, eu disse QUINHENTAS) normas da legislação ambiental no ano de 2019. A discussão sobre mudanças climáticas, como eu costumo dizer em todos os textos, sempre foi vista como algo do futuro. Algo para daqui vinte, trinta, cinquenta anos. Mas a realidade dos fatos já está se impondo, e é absolutamente inviável esperar mais um único dia para agir e adotar medidas de mitigação e adaptação climática.

Se as mudanças climáticas não forem pauta central nas eleições municipais desse ano, as cidades continuarão sofrendo os impactos dos efeitos das mudanças climáticas. E, se as cidades são afetadas, as pessoas estão sendo afetadas. Os animais estão sendo afetados. Toooooda a biosfera e os ecossistemas daquela região estão sendo afetados.

Por isso é fundamental ouvir o que os ambientalistas, os cientistas e os ativistas socioambientais vêm dizendo há décadas. A própria Ministra Marina Silva fala sobre esse assunto há décadas. E, por décadas, nós fomos chamados de “ecochatos”, “abraçadores de árvores”, “galera que bate palma para o pôr do sol”. E não é nada disso. O que nós, os ativistas, e também os especialistas vimos dizendo é que é preciso agir com urgência para adotar medidas que de fato preparem as cidades e as pessoas para a realidade a ser enfrentada. As mudanças climáticas já estão trazendo seus impactos. Os anos de exploração desmedida e descabida da natureza estão cobrando seu preço. Os séculos de existência em um sistema socioeconômico perverso, excludente e cruel já são insustentáveis há muito tempo. Agora, mais do que nunca.

Que as enchentes no Rio Grande do Sul sirvam para trazer à tona a reflexão, a conscientização e, acima de tudo, a ação para com as questões mais urgentes dos nossos tempos, entre elas a realidade das mudanças climáticas.

Compartilhe:

Colunistas

Luiza Moura

Luiza Moura

Thaciana de Sousa Santos

Thaciana de Sousa Santos

Vinicius Almeida

Vinicius Almeida

Acompanhe nas redes

ASSINE NOSSO BOLETIM

publicidade