Material, que pode ser reprogramado e desintegrado, foi desenvolvido por cientistas de Hong Kong
Uma equipe liderada por pesquisadores da Universidade da Cidade de Hong Kong desenvolveu um spray com uma espécie de cola magnética para envolver objetos e transformá-los em milirrobôs, dispositivos de alguns milímetros que podem ser controlados por um campo magnético para “andar”, “engatinhar” e rolar em diferentes superfícies.
Como a cobertura magnética do milirrobô é biocompatível e pode ser transformada em pó, a tecnologia demonstra potencial para aplicações biomédicas como controle do movimento de um catéter ou condução de fármacos a partes específicas do corpo. O estudo foi divulgado em artigo publicado na revista Science Robotics na quarta-feira, 18.
“Nossa ideia é que, colocando essa ‘capa magnética’, podemos transformar qualquer objeto em um robô e controlar sua locomoção. O spray que desenvolvemos pode grudar no objeto-alvo e ‘ativá-lo’ quando conduzido por um campo magnético”, explicou Shen Yajing, principal autor do artigo.
Composto por álcool polivinílico, glúten e partículas de ferro, o M-spray (o M é de “magnético”) pode aderir a superfícies lisas ou ásperas de maneira instantânea. O filme formado por ele varia de 0,1 a 0,25 mm de espessura, fino o bastante para não alterar o tamanho, a forma ou a estrutura dos objetos.
Após cobrirem os objetos com o spray, os cientistas os magnetizavam, para poderem controlar como eles seriam movidos. Essa magnetização é feita quando o spray ainda está líquido, através da aproximação de um ímã, cuja posição em relação ao objeto definirá a direção para onde as partículas magnéticas da cobertura vão apontar. Depois disso, vem o processo de cura térmica, ou seja, a exposição dos objetos ao calor para solidificar a cobertura.
A grande novidade desse estudo é a possibilidade de reprogramar o modo de locomoção dos milirrobôs. Yang Xong, outro autor do artigo, explicou que, em geral, a estrutura inicial de um milirrobô é fixada quando ele é construído, restringindo a versatilidade nos movimentos. Os milirrobôs desse estudo, porém, podem ser reprogramados com o uso de água e a exposição a um campo magnético forte.
Foram construídos milirrobôs em diferentes formatos, a partir de diferentes materiais. Uma linha de algodão virou o “robô réptil”, que se locomove de forma semelhante a um mede-palmo. Um filme de PDMS (um tipo de polímero) virou o “robô caminhante”, um pedaço de tubo plástico virou o “robô rolador”, e assim por diante. Cada variação tem propriedades que podem ser úteis em diferentes ambientes.
A possibilidade de reprogramar o movimento também se mostrou útil em experimentos com um catéter, um tubo usado para administrar medicamentos diretamente nos vasos sanguíneos. O catéter coberto pelo spray conseguiu realizar curvas fechadas ou suaves sem que o fluxo do líquido sofresse interferências significativas.
Outra característica importante do material da cobertura é que ele pode ser desintegrado, transformado em pó, e então absorvido e excretado pelo organismo, uma vez que seus componentes são biocompatíveis.
Os pesquisadores realizaram testes com coelhos, administrando uma cápsula por via oral e depois acompanhando seu trajeto por meio de ultrassom, com os coelhos anestesiados. Com a cápsula no local desejado, aplicaram um campo magnético para desintegrá-la. Com algumas variações (uma camada extra de álcool polivinílico ou usando níquel em vez de ferro), a equipe conseguiu retardar sua desintegração.
Perguntado pelo Ciência na rua se a umidade ou os fluidos dentro do coelho não podiam interferir no campo magnético dos milirrobôs, já que água é parte método para reprogramá-lo, Shen esclareceu que, para a reprogramação, é necessária também a exposição a um campo magnético muito mais forte do que o utilizado para controlar os movimentos dos milirrobôs.
“Os resultados de nosso experimento indicou que diferentes milirrobôs podem ser construídos com o M-spray e adaptados para vários ambientes, condições de superfície e obstáculos. Esperamos que essa estratégia de construção possa contribuir para o desenvolvimento e a aplicação de milirrobôs em diferentes campos, especialmente para tarefas em espaço limitado”, explicou Shen.