Apesar de existirem registros anteriores de fragmentos dessa espécie na região, os pesquisadores afirmam que o material encontrado agora se trata do exemplar mais completo. A importância do achado acabou, segundo a pesquisadora, revelando a falta de infraestrutura especializada para armazenar materiais desse porte na Síria e motivando a implementação de uma nova numeração para catalogar fósseis sírios que sejam eventualmente preservados pelo Estabelecimento Geral de Geologia e Recursos Minerais. A coluna do elasmossauro foi denominada GEGMRD 0001.
Além do impacto na catalogação dos achados paleontológicos, Wafa destaca a relevância da descoberta para o melhor entendimento da distribuição dos elasmossauros pelo planeta. Enquanto isso, o professor Langer lembra que a existência de répteis marinhos, tubarões e outros tipos de peixes já era conhecida na região, “inclusive já se conheciam elasmossauros, mas com pouquíssimo material. Agora a gente tem uma informação melhor”.
Ainda de acordo com Langer, o material, com cerca de 85 milhões de anos, não possui muitos registros contemporâneos ao redor do globo e preenche uma lacuna cronológica, mostrando também a presença desses animais naquela região durante o Cretáceo, o que melhora a compreensão do ambiente e dos habitats que existiam na região naquela época.
Conjunto de vértebras do elasmossaurídeo da Síria, no sítio arqueológico – Foto: Reprodução do artigo/GEGMRD
Plesiossauros e os elasmossaurídeos
Os elasmossaurídeos fazem parte do grupo dos plesiossauros, répteis marinhos presentes nos oceanos durante a era Mesozóica e parentes distantes dos lepidossauros, grupo que hoje inclui as serpentes e lagartos.
A abundância desses répteis atingiu seu ápice no período Jurássico e início do Cretáceo, de acordo com o professor Langer, mas sua presença começou a declinar no final do Cretáceo, chegando à extinção cerca de 66 milhões de anos atrás, na mesma época que os dinossauros.
Os elasmossaurídeos eram conhecidos pelos corpos compactos, caudas curtas e pescoços extraordinariamente longos, alguns até maiores que o restante do corpo do animal, mas com cabeças pequenas. Seguindo as características anatômicas conhecidas, o paleontólogo explica que o estilo de natação dos animais não partia da ondulação do corpo, mas sim “pelo movimento das nadadeiras”, semelhante às tartarugas-marinhas e as focas.
Valorização das riquezas naturais do Oriente Médio
Conjunto de vértebras do elasmossaurídeo da Síria, no sítio arqueológico – Foto: Reprodução do artigo/GEGMRD
Wafa é graduada e mestre em biologia pela Universidade de Damasco. Refugiada dos conflitos da Síria, a pesquisadora viu no Brasil um dos “poucos países” que à época ofereciam visto para sírios, a oportunidade de continuar desenvolvendo pesquisas na área da paleontologia. Na USP de Ribeirão Preto, foi acolhida pelo professor Max Langer, que se tornou o orientador de seu doutorado, apresentado à FFCLRP em 2021.
Para Langer, a história da pesquisadora vai ao encontro da valorização da paleontologia no Oriente Médio. Acredita que, com o maior conhecimento dos fósseis, as comunidades locais podem ser incentivadas a proteger as riquezas naturais.
Informa o paleontólogo que a Síria não possui, por exemplo, um museu de história natural. A descoberta deve agregar valor às peças paleontológicas “porventura encontradas no futuro” e conscientizar as pessoas, como os trabalhadores de minas, sobre a importância de entregá-las às autoridades para possibilitar novos estudos.
Wafa também vê um futuro promissor na pesquisa dentro da paleontologia em seu país. “Essa e outras descobertas, nas quais estamos trabalhando, certamente atrairão a atenção dos sírios para a importância desse patrimônio”, comemora.
A pesquisa Recovering lost time in Syria: New Late Cretaceous (Coniacian-Santonian) elasmosaurid remains from the Palmyrides mountain chain, publicada na Science Direct em 2024, contou com colaboração de membros do Departamento de Biologia da FFCLRP e do Departamento de Zoologia do Instituto de Biociências (IB) da USP, com pesquisadores internacionais da Alemanha, Canadá, Estados Unidos, Síria e Suécia. Contou também com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e da Fundação Nacional de Ciência (NSF) dos Estados Unidos.