Quem tem asma e conhece bem a sensação angustiante, quase desesperadora, de sufocação quando uma crise começa a avançar sem um remédio à mão que a detenha imediatamente, só tem a festejar os bons programas de pesquisa e controle da doença. E esse é seguramente o caso do Programa de Controle da Asma na Bahia (ProAR) e do Núcleo de Excelência em Asma da Universidade Federal da Bahia (UFBA), coordenados respectivamente pelos professores Adelmir Souza-Machado e Álvaro Cruz, que, desde a semana passada, dispõem de instalações físicas renovadas e reaparelhadas.
Essa revitalização do espaço físico e os novos equipamentos laboratoriais e de assistência respiratória, uma necessidade urgente, segundo Souza-Machado, também diretor do Instituto de Ciências da Saúde da UFBA, valeram inclusive a reinauguração das instalações do Ambulatório Central de Referência, localizado na Rua Carlos Gomes, Centro de Salvador, na terça, 26 de julho.
“Atendemos cerca de 1.200 pacientes por mês, com uma equipe de médicos, enfermeiros, farmacêuticos e assistentes sociais. Implantado em 2003, o programa, cresceu bastante e foi preciso ampliar o espaço para prestar a assistência multiprofissional adequada”, disse ele. Durante os oito meses de obras, o ambulatório funcionou nas instalações do Terreiro de Jesus da Faculdade de Medicina e no Instituto de Ciências da Saúde (ICS/UFBA). Projetos de pesquisa feitos em parceria com instituições internacionais ajudaram a financiar a modernização do espaço.
A asma é uma doença crônica que pode ter origem alérgica ou não, e no segundo caso está relacionada com más condições de higiene e moradia. A exposição a fatores como poeira, fumaça, mofo e produtos químicos com cheiro muito forte pode desencadear seus sintomas.
O diagnóstico não é tão simples quanto o de outras doenças e se baseia exatamente em sintomas, tais como tosse, chiado no peito e falta de ar recorrentes. Em períodos de crise, a asma pode comprometer a capacidade do paciente executar atividades cotidianas e profissionais e, se não diagnosticada e tratada corretamente, pode até provocar a morte por asfixia.
Segundo dados de estudos do Núcleo de Excelência em Asma e do Grupo SCAALA (Social Change Asthma and Allergy in Latin America), coordenado por Maurício Barreto, também professor da UFBA e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz-Bahia), 10% das crianças com sintomas de asma em Salvador apresentam a forma grave da doença.
Apesar disso, o ProAr junto com o Núcleo da UFBA conseguiram uma redução de 74% das internações por asma em Salvador, entre os anos de 2003 e 2006. A chamada intervenção educacional oferecida a pacientes e familiares para o controle da doença, mais o investimento em pesquisa e o fornecimento de medicação concorreram para esse resultado. Evitou-se algo como 1200 internações por ano, gerando uma grande economia para o Sistema Único de Saúde (SUS) desde os primeiros anos de funcionamento do programa, que segue em frente a despeito do apoio limitado às suas atividades assistenciais pelas diversas instâncias do SUS.
“O Brasil está entre os oito países do mundo que mais registram casos de asma, com uma média de três mortes por dia no país em decorrência da falta de tratamento correto”, observa Álvaro Cruz, professor da Faculdade de Medicina da UFBA. No entanto, ele destaca, a doença pode ser controlada com os cuidados adequados e, nos casos mais simples, os sintomas podem melhorar espontaneamente.
“Os casos graves devem ser tratados regularmente com medicação que é fornecida pelo SUS, essencial para que o paciente respire melhor e tenha uma vida normal”, diz Cruz, que é membro da Iniciativa Global contra a Asma. O objetivo dessa organização é divulgar o conhecimento sobre a asma entre profissionais de saúde e equipe multidisciplinar que atuam no tratamento da doença e oferecer aos pacientes e seus familiares acesso a informações para seu controle.
As diretrizes para o controle da doença, publicações científicas e o contato de associações de pacientes, entre outras informações relevantes, podem ser acessadas pelo site https://www.ginanobrasil.org.br ou www.ginasthma.org.
Álvaro Cruz ressalta a necessidade de investimento e aperfeiçoamento de políticas públicas para o controle e tratamento da asma, aliando o acesso a medicamentos essenciais à capacitação das equipes de saúde da família e à constituição de centros de referência para a asma grave.
Recentemente, durante o Congresso da UFBA (14 a 17 de julho), foram apresentadas pesquisas que visam a promover melhorias no tratamento da doença e na qualidade de vida dos pacientes, orientadas por ele na pós-graduação. Entre elas está a investigação de um biomarcador para a asma grave, capaz de avaliar, entre outros parâmetros, a associação entre a doença e eosinofilia sanguínea – contagem elevada de um tipo de leucócito, o eosinófilo, no sangue. A expectativa é de que, a partir de um exame de sangue corriqueiro, seja possível identificar o tipo de asma que afeta cada paciente e orientar o tratamento mais adequado da asma grave, em casos em que o tratamento habitual não é suficiente para o controle da enfermidade. O teste normalmente utilizado para o diagnóstico da asma é a espirometria, contudo há uma busca em todo o mundo por biomarcadores que indiquem os tipos diferentes de asma e orientem com mais precisão opções de tratamento.
Adoção pela OMS
Criado em 2003 a partir de um projeto de extensão da Faculdade de Medicina, o ProAr destinava-se a coordenar as ações de prevenção e assistência a pacientes portadores de asma no âmbito do SUS na Bahia.
Em 2007, o ProAR foi adotado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um programa modelo para o controle da asma em países de renda baixa ou média. O grupo de pesquisadores do ProAR e do Núcleo de Excelência em Asma, do Serviço de Imunologia do Hospital Universitário, liderado pelo professor Edgar Carvalho, juntamente com o grupo do Projeto SCAALA, que reúne também pesquisadores do Instituto de Saúde Coletiva (ISC/UFBA) liderados pelo professor Maurício Barreto, do Instituto de Ciências da Saúde (ICS/UFBA), conseguiram constituir um dos principais polos de pesquisa em asma na América Latina. O programa já contou com financiamentos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Fundação Wellcome e da empresa britânica GlaxoSmithKline.
*Murilo Guerra é repórter da Assessoria de Comunicação da UFBA