Na noite da quarta feira, 4 de maio, entre as várias peças componentes de uma cerimônia de gala na Escola Naval do Rio de Janeiro que integrou as comemorações ao longo da semana pelos 100 anos da Academia Brasileira de Ciências (ABC), o físico Paulo Artaxo, hoje um dos mais festejados cientistas brasileiros, recebeu o Prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia. A honraria é concedida pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), juntamente com a Marinha e a Fundação Conrado Wessel.
Num discurso conciso e contundente, a rigor, voltado a destacar os atores a quem queria dedicar o prêmio recebido, Artaxo, muito conhecido por suas pesquisas sobre o clima, em especial na Amazônia, lembrou que organizou muitas expedições científicas a essa região que o levaram a contratar com frequência pessoal local para operar equipamentos que fazem medidas contínuas por muitos anos. “Encontramos pessoas extremamente criativas, inteligentes e sábias, que poderiam estar aqui nesta sala conosco, mas não tiveram a chance de frequentar uma escola. Algumas mal aprenderam a escrever”, disse. Dedicou então o prêmio “a essas pessoas e à enorme massa da população brasileira que não tiveram oportunidade de receber educação formal, mas que fazem circular saberes através da oralidade”. Completou observando para as centenas de cientistas presentes, além das autoridades ligadas à área de ciência e tecnologia presentes, que “todos nós temos uma dívida com esses brasileiros, dívida essa que vem sendo sanada lentamente, por meios dos programas afirmativos de inclusão, tanto das pessoas quanto dos conhecimentos que elas trazem”.
Mais adiante ele afirmou que “nosso país está passando atualmente por momento difíceis e críticos para seu futuro”. Acrescentou que “a condição fundamental para que a pesquisa científica se desenvolva, e o conhecimento avance cada vez mais, é garantir as liberdades democráticas. Que o Brasil continue a sua caminhada respeitando os princípios da democracia, e que possamos, daqui a algum tempo, comemorar a força de nossas instituições, continuando a fazer ciência de alto nível, com financiamento forte e de longo prazo, algo estratégico para o futuro do Brasil”.
Vale a pena ler na íntegra, abaixo, o curto discurso de Paulo Artaxo, que o Ciência na rua tem a honra de incluir entre seus colaboradores:
“Eu gostaria de agradecer ao MCTI, ao CNPq, à Marinha do Brasil e à Fundação Conrad Wessel por esta premiação. Sinto-me extremamente honrado por ter sido escolhido entre milhares de pesquisadores brasileiros bem qualificados.
Uma das áreas do meu trabalho envolve o entendimento das relações entre o funcionamento físico, químico e biológico da Floresta Amazônica e o clima. Nessa tarefa, eu organizei muitas expedições científicas à Amazônia. Tivemos que contratar pessoal local para operar nossos equipamentos que fazem medidas contínuas por muitos anos. Encontramos pessoas extremamente criativas, inteligentes e sábias, que poderiam estar aqui nesta sala conosco, mas não tiveram a chance de frequentar uma escola. Algumas mal aprenderam a escrever. Dedico este prêmio a essas pessoas e à enorme massa da população brasileira que não tiveram oportunidade de receber educação formal, mas que fazem circular saberes através da oralidade. Todos nós temos uma dívida com esses brasileiros, dívida essa que vem sendo sanada lentamente, por meios dos programas afirmativos de inclusão, tanto das pessoas quanto dos conhecimentos que elas trazem.
Outra área em que trabalho é a das mudanças climáticas globais. Trata-se do maior desafio confrontado pela humanidade até o momento, porque coloca em risco o futuro de nosso planeta. Precisamos de ciência de qualidade para enfrentar adequadamente esse processo, que já está em curso, causando fortes impactos. O sistema socioeconômico fundamentado no lucro a qualquer preço é incompatível com a sustentabilidade do planeta. Ou agimos com celeridade, ou nossos filhos, netos e mais de 10 bilhões de pessoas viverão em um clima muito mais inóspito, com importantes implicações socioambientais. A ciência vem exercendo um papel fundamental nesta questão e, agora, planos de adaptação e mitigação vão precisar de pesquisas inovadoras.
Como sabemos, nosso país está passando atualmente por momento difíceis e críticos para seu futuro. A condição fundamental para que a pesquisa científica se desenvolva, e o conhecimento avance cada vez mais, é garantir as liberdades democráticas. Que o Brasil continue a sua caminhada respeitando os princípios da democracia, e que possamos, daqui a algum tempo, comemorar a força de nossas instituições, continuando a fazer ciência de alto nível, com financiamento forte e de longo prazo, algo estratégico para o futuro do Brasil.
Por fim, dedico este prêmio Almirante Álvaro Alberto à minha família, Ana Paula, minha mulher, Pedro e Carolina, meus filhos. Todos nesta sala sabem que o equilíbrio entre o tempo dedicado à família e ao trabalho é sempre uma questão delicada, principalmente quando temos paixão pelo que fazemos e consciência da responsabilidade para o futuro. Ao longo da vida, tive que me dedicar muito à ciência, subtraindo tempo de convívio com minha família. Por isso, este prêmio também é de vocês, Ana Paula, Pedro e Carolina.
Obrigado a todos, em especial ao CNPq, MCTI, Marinha do Brasil e à Fundação Conrado Wessel.”