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Passaram a boiada

Por Luiza Moura

Ativistas socioambientais no Brasil vivem dias de medo, preocupação, estresse e vontade de chorar, diz colunista 

Indígenas protestam durante Acampamento Terra Livre, em Brasília (Célio Kanela)

           

As últimas semanas foram um completo caos na vida de todos os ativistas socioambientais do país. Não foram poucos os eventos ou projetos que nos causaram medo, preocupação, estresse e vontade de chorar (bom, pelo menos eu chorei muitas vezes). O projeto de exploração de petróleo na Foz do Amazonas, a MP 1154 que retira atribuições do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e do Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática (MMAMC), e o PL 490 do Marco Temporal foram alguns dos problemas que nós enfrentamos nos últimos dias.

Bom, mas vamos começar do começo: a primeira briga que tivemos que comprar nos últimos dias foi para defender o Ibama, órgão técnico responsável por avaliações científicas que negou que se explorasse petróleo na costa do Amapá, na bacia da Foz do Amazonas. Eu achei que em 2023 eu não teria que explicar o óbvio, mas aparentemente, nós precisamos. Explorar petróleo nessa região (ou em qualquer outra) é algo extremamente perigoso. Toda a biodiversidade local pode ser afetada e, além disso, a nota do Ibama revelou que, em caso de possíveis vazamentos, o socorro da Petrobras levaria cerca de 43 horas para chegar, ou seja, seriam quase dois dias de vazamentos ininterruptos.

O que todo o mundo aponta e o que o Brasil deve fazer é caminhar para a descarbonização da economia. É fazer uma transição energética justa, limpa, sustentável e democrática, para que possamos parar de pautar a economia no mercado de carbono, que é, comprovadamente um dos maiores responsáveis pela crise climática que a humanidade já enfrenta. Portanto, está correta a posição do Ibama em negar a licença para mais um local explorar petróleo. Ah, e vale lembrar que atacar e tentar desacreditar o órgão é coisa de negacionista e bolsonarista. Fica a dica.

Depois, veio a quarta-feira da semana passada, caraca, que apocalipse! Primeiro, foi aprovada na Comissão a MP 1154 que reorganiza os Ministérios do Governo Lula e que, de maneira bastante perigosa, retira atribuições do Ministério dos Povos Indígenas e do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. O MPI passaria a não ter mais direito a definição sobre demarcação de terras indígenas, por exemplo. Já o MMA perdeu o controle sobre a Agência Nacional de Águas e sobre o Cadastro Ambiental Rural. Com isso, os ministérios ficam enfraquecidos e perdem algumas de suas principais atribuições. O relator do projeto é o deputado Isnaldo Bulhões do MDB. Deputado, tire a mão do MMA e do MPI. Nós queremos nossos ministérios fortes e atuantes.

No mesmo dia, na calada da noite e de surpresa, o presidente da Câmara Arthur Lira botou em votação a urgência do PL 490, o projeto do Marco Temporal, que é um verdadeiro e horroroso ataque aos povos indígenas do Brasil. Além de apagar a história dos povos indígenas, os verdadeiros habitantes originais desse país, o Marco Temporal abre espaço para garimpeiros, grileiros e madeireiros nesses territórios, além de considerar a permissão para grandes obras de infraestrutura nessas terras.

Ah, e anteontem, dia 30 de Maio, a Câmara aprovou por grande maioria o projeto. Como disse a Ministra Sônia Guajajara é a institucionalização do genocídios das populações originárias do Brasil.

Pois é, leitor, passaram a boiada. Literalmente. Os últimos dias foram de verdadeiros ataques e desmontes na área ambiental, ficou mais do que claro que a emergência climática, a defesa de um meio ambiente saudável e a proteção da biodiversidade não são uma prioridade para grande parte do Legislativo brasileiro. A verdade é essa, o Congresso tem ignorado sistematicamente as manifestações sociais e as pressões populares que colocam essa pauta como uma das mais importantes para o país.

Ou, talvez, o que os senhores e as senhoras congressistas ainda não tenham entendido é que se o mundo acabar e o planeta esquentar, eles também serão prejudicados. Ninguém vai ser salvo por ser deputado, deputada, senador ou senadora. Mas, é óbvio, algumas pessoas sofrerão tudo isso de forma muito mais acentuada e perigosa, aliás, já sofrem. E o nome disse é racismo ambiental. Mas, talvez seja isso também. Os senhores e as senhoras não se preocupam porque estão sendo mais afetadas pessoas, pretas, pobres e indígenas.

Mas fiquem cientes, senhores legisladores, que nós não vamos esquecer que o desmonte socioambiental brasileiro passa pelas mãos de vocês. Nós não vamos deixar os senhores e as senhoras acabarem com o país. Vamos cobrar. Vamos pressionar. E não vamos deixar o desmonte acontecer.


Luiza Moura é estudante de relações internacionais na PUC-SP e ativista socioambiental

 

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