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Na contramão

por | 19 maio 2023

Por Luiza Moura

O meio ambiente não pode ser sacrificado mais uma vez, a crise presente pede mudança, diz colunista em comentário sobre o anunciado  incentivo aos carros populares

Carros – São Paulo (Léo Ramos)

Na semana passada, o presidente Lula anunciou que daria um incentivo a “carros populares” para que pessoas com menor poder aquisitivo pudessem também comprar automóveis e para estimular a retomada da indústria automobilística. A questão está sendo trabalhada, principalmente, pelas áreas econômicas do governo. Mas, me parece importante, discutir os impactos ambientais do projeto.

Os carros são, comprovadamente, alguns dos maiores emissores de gases poluentes e de efeito estufa. Mais do que isso, a grande maioria é movida por gasolina, derivada do petróleo. Ou seja, trata-se de um produto movido à base de combustíveis fósseis, um dos maiores vilões ambientais e, com toda a certeza, um dos maiores responsáveis pela crise climática já enfrentada pelos seres humanos.

Aliás, um relatório feito pela Organização Meteorológica Mundial e publicado na quarta-feira (17/05), afirmou que até 2027 a Terra passará por ondas de calor como nunca vistas antes. Há uma probabilidade de 98% de que os próximos cinco anos sejam os mais quentes da história do planeta. Como disse o IPCC no relatório publicado no ano passado, estamos nos aproximando cada vez mais do ponto de não retorno. Será que é mesmo uma boa ideia incentivar máquinas que são grandes causadoras desses impactos??

É importante, nesse momento da história da humanidade, se questionar se é realmente necessário incentivar a produção de mais carros, gerando, por consequência, mais emissões de gases de efeitos estufa, mais poluentes e piorando, inclusive, outros problemas já enfrentados por grandes cidades. Um maior número de carros circulando significa, necessariamente,  trânsito mais pesado, prejudicando a mobilidade urbana e fazendo com que trabalhadores passem mais tempo se deslocando, por exemplo.

Compreendo a necessidade de movimentar a economia, pensar em formas de se incentivar o projeto econômico do país que queremos. Mas, enquanto ativista socioambiental, eu questiono: é necessário, mais uma vez, prejudicar o meio ambiente e o clima em suposto benefício da economia?

Mais do que isso, acho que é necessário pensar em algumas incongruências entre discurso e prática. Durante a campanha e nos primeiros dias após a eleição, o presidente Lula foi muito incisivo quando disse que a pauta ambiental seria uma prioridade no seu governo. O governante chegou, inclusive, a ir para a Conferência das Partes, COP, onde foi muito bem recebido por diversos líderes do mundo. Porém, o que estamos vendo nesse momento, é uma proposta de Lula que vai contra tudo aquilo que foi dito. O incentivo a carros vai, justamente, na contramão dos esforços que vêm sendo feitos para diminuir a emissão de gases de efeito estufa e tentar limitar o aumento da temperatura do planeta.

Nesse sentido, o que estamos vendo é uma política que está presa no passado, que não leva em consideração os avanços feitos nos últimos anos, o agravamento da crise climática e a emergência desse tema como algo urgente. Entendo que o incentivo aos carros não é mais algo que caiba no ano de 2023, ao contrário, penso que cada vez mais devemos lutar para tirar o carro desse lugar de “status” ou de poder.

Por isso gostaria de sugerir ao presidente Lula, mas também a todos os governantes estaduais e municipais, que passem a investir em outras formas de transporte e a propagá-las. Nesse caso, faz muito mais sentido, por exemplo, fazer uma grande campanha nacional pelo uso de bicicletas, que envolva estados e municípios e que, além de uma conscientização coletiva, implique a construção de ruas mais seguras para ciclistas, numa grande parceria entre os três entes da federação.

Outra possibilidade é um maior incentivo aos transportes públicos: ônibus, metrôs e trens de superfície são opções menos poluentes já que atendem a um maior número de pessoas em um único veículo, tornando-se uma via muito mais sustentável do que um grande aumento do número de carros em circulação.

Assim, volto a fazer o questionamento: é realmente necessário incentivar carros num cenário em que é preciso justamente diminuir a emissão de gases que esses veículos produzem? Presidente Lula, acho que existem formas melhores de incentivar a economia. O meio ambiente não pode ser sacrificado em nome de grandes empreendimentos econômicos mais uma vez.  O presente pede mudança.


Luiza Moura é estudante de relações internacionais na PUC-SP e ativista socioambiental

 

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