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Uma década de Café Científico na Bahia (e o tema da segunda é zika)

Na próxima segunda feira, 23 de maio, às 18:30 horas, o zika será abordado na Biblioteca Central dos Barris, em sessão aberta a qualquer pessoa que tenha grande curiosidade sobre ele,  por alguém que sabe bastante sobre esse vírus ainda pouco conhecido, cheio de mistérios e pleno de desafios: o professor Gúbio Soares.

Para quem não está lembrado, foi esse virologista o pioneiro no isolamento do vírus da zika no Brasil, em Salvador, em abril de 2015, ao lado da colega também virologista Sílvia Inês Sardi, e com a colaboração do infectologista Antonio Bandeiras, todos pesquisadores ligados ao Laboratório de Virologia do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Até aí circulavam conversas sobre uma intrigante síndrome de Camaçari cuja causa ninguém sabia.

Gúbio é o convidado do Café Científico, um evento aberto de divulgação científica que neste ano está completando 10 anos de presença ininterrupta na cena científico-cultural de Salvador – um marco. E isso graças à iniciativa de um pequeno grupo e à persistência, para não dizer simplesmente boa teimosia, de Charbel El-Hani, cientista, e Primo Maldonado, livreiro. Talvez se deva acrescentar a esses dois nomes o de Fabiano de Souza Vieira, um jovem estudante quando essa história começou.

Charbel, 48 anos, respeitado pesquisador em história, filosofia e ensino das ciências, e com atuação significativa em ecologia e evolução, coordena, no Instituto de Biologia da UFBA, o Laboratório de Ensino, Filosofia e História da Biologia (LEFHBio), onde trabalham cerca de 50 pessoas, entre pesquisadores, pós-graduandos, alunos de graduação e professores da rede pública.

A alta produção desse Laboratório se traduz, por exemplo, na publicação, em média, de 10 artigos científicos por ano, boa parte deles em periódicos científicos internacionais indexados, de primeira linha em sua área. Recentemente, depois de uma avaliação internacional e nacional rigorosa, saiu a lista das propostas de novos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs) aprovadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e a de Charbel ocupa o 10º lugar num total de 252.

Tranquilo de aparência, Charbel  é, digamos assim, uma espécie de dínamo multiorientado, capaz de se meter em múltiplas empreitadas simultaneamente. Mas há um foco permanente a articulá-las: o avanço da educação científica e da divulgação científica, perseguido em projetos de pesquisa teórica e aplicada e em projetos de extensão.

Foi assim que esse carioca, que aos nove anos se mudou para a Bahia e se tomou de amores pela terra, nem tão generosa assim com projetos científicos, chegou ao seu Café Científico. Registre-se aqui brevemente, antes do Café, que Charbel fez vestibular para Biologia na UFBA, que adorava, mas a mãe conseguiu uma transferência do jovem para a UFRJ, no Campus do Fundão. O jovem passou lá quatro amargurados meses e, quando decidiu que rompia com a família, mas voltava para a Bahia, por sorte uma greve sustara a finalização de seu processo de transferência e ele pode voltar lépido e fagueiro para a UFBA.

Diga-se ainda que na graduação  em biologia na UFBA, e estagiando em biologia celular e molecular, tratou de nas férias ir fazer estágios no laboratório de Carlos Menck, na Universidade de São Paulo (USP), respeitado biólogo molecular. “Além de muito estimulante, isso foi fundamental para baixar minha bola, reduzir os excessos do ego, coisa importante para a carreira pela vida toda. Se eu achava que sabia bastante biologia, lá muita gente mais sabia muito”, comenta. Por dever de justiça, acrescente-se que sua formação nesse período incluiu estágio no Laboratório de Imunologia e Biologia Molecular orientado por Maria de Fátima Dias Costa e Roberto Meyer.

O jovem inquieto, professor da UFBA mal se graduara, orientado por Felippe Serpa, que fora da Física para a educação, transitou também da biologia para educação, fazendo uma crítica à abordagem reducionista dos modelos de biologia celular e molecular com os quais estava envolvido. Ao sair para o doutorado com Nélio Bizzo na USP, na verdade ele já deixava, em 1996, um pequeno laboratório à sua espera na UFBA, enquanto completaria seu caminho para a história, filosofia e ensino de ciências. Em 2000, ao voltar do doutorado, concentrou-se em expandir o laboratório e a produção científica. E então, em 2006, veio a ideia do Café Científico.

“Eu li na Nature Review Genetics, bem num momento em que procurava uma via de mais ligação com a sociedade, uma matéria sobre toda a iniciativa Café Scientifique (https://www.cafescientifique.org)que começara em Birmingham, Inglaterra. E pensei: é isso, um evento periódico fora da universidade”, conta Charbel.

Fabiano de Souza Vieira e outros alunos se entusiasmaram. De repente era um grupo que tentava implantar a ideia. Primo Maldonado, dono da livraria LDM Multicampi, se entusiasmou e virou parceiro para valer da ideia. Tanto que os cafés começaram na filial da Piedade de sua livraria, em pleno centro da cidade.

No começo era segunda, 18 horas, uma vez por mês. Passou para as sextas, voltou para as segundas, de dois em dois meses, saiu da livraria quando a filial da Piedade da rede fechou, foi para a Biblioteca dos Barris, e resiste. Primo sempre ali. O Café Científico é um braço de extensão universitária do Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofa e História das Ciências (UFBA/UEFS). O público variou ao longo desses anos de 20 a mais 200 pessoas por Café, mas a média está entre 30 e 40 atentos ouvintes/debatedores.

Poderia crescer, os temas são sempre de interesse público, não cifrados. Pode crescer ao longo dos próximos 10 anos, a ciência mais e mais visível no cotidiano de todos. Quem sabe?

 

 

 

 

 

 

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