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Uma campanha para premiar Michel Nussenzweig no Brasil
Premiação

por | 26 jun 2016

Ilustração Nussenzweig

Em ilustração de Nara Lacerda, 12 anos, Michel Nussenzweig, coordenador do estudo sobre o uso de clones de anticorpos de pacientes resistentes ao HIV em outros pacientes

Na quarta feira, 22 de junho, a Nature publicou os resultados de um estudo coordenado por Michel Nussenzweig demonstrando que clones de anticorpos retirados de pacientes com uma resistência natural maior ao vírus da AIDS protegeram outros pacientes que tinham deixado experimentalmente de tomar as drogas antirretrovirais e, talvez, tenham engajado outra vez seu sistema de defesa no combate ao vírus.

É esse cientista, professor na Universidade Rockefeller, em Nova York, agraciado neste ano com o prêmio Robert Koch, a maior honraria científica da Alemanha, que o professor Sérgio Mascarenhas, da Universidade de São Paulo em São Carlos (USP-São Carlos), propôs neste final de semana homenagear também no Brasil. Ressalte-se que anos antes Mascarenhas propusera que fosse desenvolvida no Brasil essa mesma pesquisa com HIV do professor Nussenzweig, brasileiro, filho de Ruth e Victor, também importantes cientistas que tiveram que deixar o país em decorrência do golpe de 1964, e terminaram se fixando nos Estados Unidos. O colega que examinou o projeto não o recomendou, por considerá-lo muito caro, e a pesquisa de Michel Nussenzweig acabou por não ter acolhida no Brasil, segundo o professor Mascarenhas.

A adesão à sugestão de que agora o cientista seja premiado no país foi imediata por parte do presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich, da presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, do presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Hernan Chaimovich, do secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência e Tecnologia (Seped/MCTI), Jailson Bittencout de Andrade e do presidente da Academia de Ciências de São Paulo, Marcos Buckeridge, entre vários outros dirigentes de instituições ligadas à ciência no país. Assim, tudo indica que se trata agora apenas de decidir que prêmio será esse.

 

Anticorpos neutralizadores – O novo estudo sobre anticorpos publicado pela Nature traz dados de um ensaio clínico com 13 pacientes infectados com o HIV-1. Aqueles que receberam quatro tratamentos com o anticorpo conhecido como 3BNC117,  a intervalos de duas semanas, experimentaram uma média de demora no retorno do vírus de 9,9 semanas, comparados com registros históricos que mostram uma média de 2,6 semanas.

“Os testes em modelos animais foram muito encorajadores, mostrando que os anticorpos podiam proteger contra a infecção”, disse Nussenzweig a Ricardo Bonalume Neto, da Folha de S. Paulo. “Anticorpos têm propriedades adicionais, eles podem engajar o sistema imune em uma forma de imunoterapia – embora não seja uma vacina, é uma proteção semelhante a uma vacina”, acrescentou.

Num estudo anterior, Nussenzweig testara em macacos uma injeção de anticorpos e o resultado foi 23 semanas de proteção contra o HIV. De fato, o que Michel Nussenzweig e colegas buscam com esses estudos são terapias baratas, aplicáveis em áreas com infraestruturas de saúde pública precárias, em especial na África. “Esse é o objetivo da Fundação Bill e Melinda Gates, que patrocina esses ensaios”, disse o pesquisador à Folha.

O HIV, um tipo de retrovírus muito simples, mas com grande capacidade de fazer mutações, ataca as células de defesa do organismo humano que deveriam impedir a infecção. As drogas antirretrovirais usadas para combatê-lo mudaram completamente, nos últimos dez anos, os prognósticos de desenvolvimento da Aids, a síndrome provocada pelo vírus. Mas além de não curar de fato a doença, elas têm efeitos colaterais, daí a busca contínua por outras terapias.

Há vários anos já se sabia que uma parte dos pacientes tem atividade ampla de anticorpos contra o vírus HIV e usar esse conhecimento em termos práticos é o que a equipe de Nussenzweig vem buscando.

Esses superanticorpos, bNAbs na sigla em inglês, de “broadly neutralizing antibodies”,  atacam diferentes alvos em uma proteína na superfície do vírus, a gp160 e Nussenzweig desenvolveu um método particularmente eficaz para cloná-los.

Os participantes do estudo publicado na revista britânica foram pararam com a medicação dos antiretrovirais dois dias depois da primeira injeção de anticorpos. De acordo com a descrição no artigo, um grupo recebeu uma dose inicial do anticorpo 3BNC117 e uma segunda 21 dias depois. Outro grupo recebeu a dose inicial e doses semelhantes 14, 28 e 42 dias depois, desde que não houvesse o retorno do vírus. Se houvesse retorno do vírus acima de um limite especificado, a nova terapia seria descontinuada e a antiga restabelecida.

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