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Os seis pontos do plano estratégico contra Zika e a microcefalia

por | 23 fev 2016

Um grupo de oito pesquisadores de vários centros brasileiros liderado por Maurício Barreto, epidemiologista vinculado à Fundação Oswaldo Cruz da Bahia (Fiocruz, Centro de Pesquisas Gonçalo Muniz) e professor da Universidade Federal da Bahia, publicou hoje no periódico médico britânico Lancet uma agenda científica com seis pontos para enfrentar o vírus Zika e a epidemia de microcefalia ou outros problemas neurológicos no país a ele aparentemente associados. Tais pontos que devem integrar o Plano de Ação Estratégica do governo destinado a enfrentar o problema.

Depois de se referir brevemente à primeira epidemia de dengue enfrentada pelo país em 1981e ao insucesso de todos os esforços feitos desde então para controlar a presença da doença em suas áreas urbanas, o artigo resume o que acontece desde 2014, com a entrada da febre chicungunya e, em 2015, do Zika, até o presente, antes de informar que, nacionalmente, duas frentes de atividades coordenadas precisam ser destacadas no enfrentamento do problema: uma força tarefa acionada pela Fiocruz, instituição científica ligada ao Ministério da Saúde, e o Grupo de Trabalho Científico do Zika Vírus, junto ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

O comentário dos pesquisadores, após ressaltar que os governos federal e estaduais e as agências científicas estão implementando iniciativas para ampliar o conhecimento sobre “essa inesperada, desconhecida e aterrorizante situação”, e que cientistas do país inteiro, de diferentes disciplinas, trabalham sobre a epidemia e suas consequências potencialmente devastadoras, parece ser o de informar a seus pares no exterior que não há uma bagunça no país, com dezenas de grupos atirando descoordenadamente cada um para um lado. Em vez disso, há uma coordenação, asseguram.

Os seis pontos propostos pelo grupo de cientistas para o Plano Nacional são os que se seguem:

  1. Ampliar a base de evidência da infecção, doenças e potenciais desdobramentos;
  2. Desenvolver um teste sorológico rápido e confiável de base imunológica;
  3. Controlar a infestação de Aedes aegypti com o objetivo de reduzir infecção e doenças;
  4. Definir protocolos para o tratamento de casos agudos (particularmente em mulheres grávidas) e prevenção das malformações congênitas severas
  5. Começar o trabalho de base para o desenvolvimento de vacina, prospectando e avaliando possíveis estratégias tecnológicas;
  6. Reprogramar o sistema de saúde para as consequências da epidemia.

A respeito da base de evidências que liga Zika a microcefalia e outros problemas neurológicos em bebês, o comentário dos pesquisadores brasileiros no Lancet lembra que se trata de um vírus conhecido há muitas décadas, mas como tema de estudo sempre foi negligenciado possivelmente pelos efeitos brandos da infecção e circulação limitada. Depois da circulação no Brasil e outros países da América Latin e Caribe, lentamente e insuficientemente começou a aparecer algum conhecimento sobre seus determinantes e desdobramentos.

Evidências existem, mas uma relação causal entre o vírus, microcefalia e lesões cerebrais em bebês recém-nascidos não foi ainda conclusivamente estabelecida, insiste Barreto e colegas. Ressalte-se que esse time é formado por alguns dos mais respeitados especialistas brasileiros em epidemiologia e doenças negligenciadas, a saber, Manoel Barral-Neto, Rodrigo Stabeli, Naomar Almeida-Filho, Pedro Vasconcelos, Mauro Teixeira, Paulo Biss e Paulo Gadelha.

O artigo retoma os dados do trabalho do Círculo do Coração de Pernambuco publicado no boletim da OMS que aponta um número muito maior de casos de microcefalia no Nordeste desde 2012 do que os registros oficiais indicavam. E propõe para o levantamento de uma base robusta de evidências que seja feito um grande estudo prospectivo, multicêntrico, envolvendo mulheres que tiveram infecção por zika e que não a tiveram . Também propõe a criação de uma grande equipe multidisciplinar para estudar todos os aspectos desconhecidos relacionados ao vírus e seus efeitos.

Em relação aos testes sorológicos, a preocupação é evitar os resultados cruzados e ter um produto realmente eficaz para detectar o Zika e não outros vírus assemelhados. Quanto ao controle do vetor, afora um uso cruzado de vários métodos, desde a infeção com Wollbachia a mosquitos transgênicos e métodos de controle de larvas, o grupo propõe novos estudos para verificar sua eficácia e sustentabilidade, além de melhoramentos do meio ambiente urbano. No aspecto tratamentos para infecção por zika, principalmente de grávidas, e encaminhamento dos bebês com malformações sérias, tudo está ainda por desenvolver. Relativamente à vacina, na contramão dos otimistas, os pesquisadores observam que, considerando a insuficiência de informação sobre os mecanismos imunológicos envolvidos na infecção por zika e experiências anteriores com dengue, há razões para ceticismo quanto à probabilidade do desenvolvimento de um produto eficaz logo.

O artigo, em relação ao seu sexto ponto, prevê grandes demandas do serviço de saúde nos próximos anos e propõe que novos padrões de atendimento sejam estudados. Entende que cooperação internacional, financiamento, um grande nível de coordenação são exigências dada a magnitude do problema.

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