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Excluídos da criação do código florestal, cientistas querem participar de sua implementação
Meio ambiente

por | 9 maio 2016

Cerrado1 Um grupo de pesquisadores de diferentes regiões do país lançou um livro branco sobre a Lei de Proteção da Vegetação Nativa (LPVN), popularmente conhecida como Novo Código Florestal. O trabalho destaca pontos positivos e negativos da nova legislação, indica aspectos que podem ou já estão sendo questionados judicialmente e alerta: a agenda ambiental precisa ser incorporada às políticas agrícolas ou qualquer iniciativa dessa natureza será inútil. Isso porque, segundo os autores, a maior parte da vegetação nativa remanescente no país (53%) se encontra em propriedades rurais particulares, e não em unidades de conservação – essa proporção chega a 90% na Mata Atlântica.

Livro branco ou relatório branco é chamado um documento formal com orientações para empresas ou governos. No caso específico, a ação é voltada sobretudo às autoridades municipais ou estaduais, que, segundo os pesquisadores, estão encontrando dificuldades para implementação da lei devido às dualidades de interpretação  ou questionamentos judiciais.

O documento de 28 de março de 2016 é assinado por Pedro Brancaliona, da Universidade de São Paulo (USP), Letícia Garciab, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Rafael Loyolac, da Universidade Federal de Goiás (UFG), Ricardo Rodrigues, também da USP, Valério Pillar, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Thomas Lewinsohn, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O trabalho foi realizado a convite da Associação Brasileira de Ciência Ecológica e Conservação (Abeco).

Criada há quatro anos e após mais de uma década de debates no Congresso Nacional, a Lei de Proteção da Vegetação Nativa é muito criticada pela comunidade científica. “Apesar de audiências públicas e consultas nominais, houve reduzida participação da sociedade civil e de cientistas cujas pesquisas eram relevantes ao tema”, diz o livro branco. “A comunidade acadêmica, por meio de entidades representativas, como a Academia Brasileira de Ciências, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Associação Brasileira de Ciência Ecológica e Conservação, formulou propostas e sugestões que foram enviadas ao Legislativo e ao Executivo. Essas propostas, porém, não foram aproveitadas na versão final da LPVN, promulgada em 2012”.

Em outro trecho, os autores afirmam que ainda há espaço para a participação de especialistas na efetiva aplicação da lei. “Para a opinião pública e mesmo para muitos técnicos e pesquisadores, após a sanção da LPVN em 2012, tornou-se irrelevante ou inútil prosseguir a discussão dos pontos polêmicos que envolveram a sua elaboração. Nosso entendimento é exatamente o oposto”.

Dessa forma, o documento faz cinco recomendações:

  • Uma maior participação da sociedade e o conhecimento científico embasem a tomada de decisão pelo Poder Judiciário na correção de possíveis distorções na LPVN no âmbito dos estados e municípios;
  • Fortalecimento de órgãos de assistência técnica rural para fomentar a implantação da lei;
  • Estimular a cadeia de negócios da recuperação da vegetação nativa;
  • A compensação da Reserva Legal se atente a critérios ambientais para seu planejamento;
  • O cumprimento da lei seja fiscalizado com base na qualidade da vegetação que é recuperada.

 

Avanços e retrocessos

 

Entre os pontos positivos da nova legislação, o documento destaca a criação do Cadastro Ambiental Rural, do Programa de Regularização Ambiental, o Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas e Alteradas e as Cotas de Reserva Ambiental. “Essas quatro ferramentas possibilitam a gestão sistemática e integrada da lei, além de obrigar e monitorar seu cumprimento”, diz o documento. Em outro trecho, os cientistas também ressaltam, no âmbito dessas medidas, os instrumentos de incentivo e adesão e um maior conhecimento por parte do Governo sobre como e quantos são os imóveis rurais.

Na lista de retrocessos, o texto sublinha a falta de cuidado com as fontes de água, por meio da exclusão das nascentes intermitentes da categoria das Áreas de Proteção Permanentes (APP), tornando-as mais vulneráveis à degradação. Além disso, acumulações naturais ou artificiais de água com superfície inferior a um hectare também deixaram de ter seu perímetro protegido como APP. “Não se considera o papel que esse conjunto de acumulações pode ter nos serviços hídricos regionais.”, afirmam os autores. O livro branco diz ainda que o estreitamento da faixa potencial de vegetação nativa a ser mantida ao longo dos cursos d’água é outro aspecto que, em conjunto, pode agravar situações de escassez de água.

Ainda sobre os retrocessos, os pesquisadores destacam os topos de morros, cujas mudanças nos critérios para a preservação desse tipo de terreno reduziram em 87% a área a ser protegida, deixando vulneráveis regiões de montanhas e serras de todo o país.

 

 

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