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Estudando os corais para explicar as mudanças climáticas
Projeto aprovado

por | 12 jan 2018

Mergulho para recolher material e informação no Atol das Rocas

E se fosse possível existir um disco rígido com informações sobre o passado dos ambientes marinhos? Um dispositivo que pudesse nos dar informações como temperatura e salinidade do mar 100 anos atrás? Essa inovação não parece muito distante, se depender do empenho e do sucesso do trabalho de Natan Silva Pereira, 33 anos, professor da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), um dos dois pesquisadores baianos que tiveram propostas incluídas entre as 65 selecionadas para financiamento pelo Instituto Serrapilheira, em todo o país, no âmbito da chamada pública de projetos inovadores encerrada em setembro de 2017. Os resultados foram anunciados em 21 de dezembro passado (veja mais aqui e aqui)

A proposta do professor de ciências biológicas é estudar a formação de corais na costa do Rio Grande do Norte e de Pernambuco para determinar as condições climáticas em tempos mais remotos, utilizando os corais como arquivos naturais.

Coletando testemunhos no Atol das Rocas

“Utilizo sinais geoquímicos de esqueletos de corais para investigar mudanças climáticas. Coleto esses esqueletos, faço a datação e a análise química. As variações do conteúdo geoquímico vão contar sobre o clima, a salinidade, a temperatura e a concentração de dióxido de carbono na atmosfera no ambiente no qual o coral cresceu. Utilizamos o coral como um arquivo climático através do seu conteúdo geoquímico”, explica o professor.

A chamada pública do Instituto Serrapilheira, criado em 2017 pelo grupo Moreira Salles, mirou propostas inovadoras de jovens cientistas, com até 10 anos de doutoramento. Recebeu 1.955 projetos originários de 331 instituições espalhadas por 26 estados, e escolheu 65 para apoiar por um ano – depois desse período, uma nova seleção definirá os 10 projetos que receberão um novo aporte de R$1 milhão, pelo período de três anos.

O outro projeto contemplado da Bahia foi o do professor Pedro Meirelles (veja mais aqui e aqui) da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Coincidentemente, os dois trabalham com ambientes marinhos e o impacto das mudanças climáticas sobre esses ambientes, e ambos incluíram suas propostas no tema da informação – além desse, o Instituto Serrapilheira definiu como temas possíveis de inscrição das propostas os de tempo, energia, identidade, matéria, forma e espaço. Em relação às áreas do conhecimento, a maioria dos projetos apresentados era das ciências da vida (60%), seguidos por engenharias (13%), química (9%), ciências da terra (6%), ciência da computação (5%), física (5%) e matemática (2%).

Natan Silva Pereira naturalmente pretende se inscrever para a segunda etapa de financiamento do Instituto. E está convencido de que terá então mais chances de vitória quem apresentar de forma inovadora, “os resultados mais importantes para a ciência, as respostas às perguntas mais relevantes e urgentes enfrentadas no desenvolvimento da primeira fase”. Ele dedicou cerca de um mês e meio à elaboração de sua proposta, que era distinta de qualquer uma que havia realizado anteriormente.

O projeto tem de inovador, além do uso dos corais como arquivo natural, os locais da pesquisa. “Os Estados Unidos já executaram o trabalho de levantamento da situação dos corais quase que no Caribe inteiro, mas no Atlântico Sul, há muito pouca informação sobre o tema”, o pesquisador comenta. “E trazê-las r essas informações à tona é importante para completar o cenário global”, diz.

Sua proposta envolve, assim, expedições para o litoral do Rio Grande do Norte, numa área chamada de Maracajaú, e de Pernambuco, na localidade de Tamandaré. Maracajaú tem uma quantidade grande das espécies estudadas e seus recifes estão em profundidades menores que os encontrados em outros locais da costa, o que facilita o acesso. Já Tamarandé, conectado ao Rio Uma, responsável por enchentes na região, além da importância direta para a população local, é um lugar privilegiado para se avaliar o aumento da influência antropogênica, ou seja, da ação humana, nas mudanças climáticas.

Detalhe da coleta de testemunhos

Natan pretende estabelecer a utilização de registro de mudanças climáticas com base em corais como um método confiável e eficaz, e bom indicador de oscilações ambientas. Estudando os corais, explicou em sua proposta ao Serrapilheira, é possível também avaliar a contaminação ambiental desse ambiente, a quantidade de chumbo absorvido e correlacionar essas mudanças com o processo da pressão antrópica (humana) em ambientes de recifes. Ele vem trabalhando em colaboração com colegas da UFBA e da Federal de Pernambuco (UFPE), onde fez mestrado e doutorado, e está fortalecendo sua própria com estudantes de graduação e, adiante, mestrandos.

Natan nasceu em Governador Valadares, Minas Gerais, mas viveu sua vida toda no Nordeste, em Salvador, Recife e agora Paulo Afonso. Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade do Estado da Bahia, além do mestrado e doutorado na UFPE, fez doutorado sanduíche na Universidade de Copenhague, Dinamarca.

Hoje é professor assistente no mesmo curso no qual se graduou, e no qual teve despertada sua vocação para a pesquisa científica. “Nunca me deixei desanimar pelas dificuldades para se tornar um cientista no Brasil”, comenta.
Sua paixão pelos corais é antiga. “Desde a graduação, já tinha um fascínio para entender esses ecossistemas. Os recifes de corais são extremamente interessantes do ponto de vista biológico”.

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